Análise de vídeos do YouTube que expõem intoxicação alcóolica

CISA – Centro de Informações sobre Saúde e Álcool

O consumo de bebidas alcoólicas por jovens, especialmente quando ocorre embriaguez, associa-se a maior probabilidade de envolvimento em comportamentos de risco e consequências negativas, como brigas, atividade sexual desprotegida, acidentes de trânsito, além do risco para dependência de álcool. Com novas mídias sociais muito acessíveis, estima-se que crianças e jovens de 8 a 18 anos são diariamente expostos por até 10 horas a mensagens virtuais.

Para melhor entendimento do impacto exercido por tais conteúdos relacionados ao álcool, um estudo teve como objetivo caracterizar os principais vídeos do YouTube relacionados à intoxicação alcoólica e analisar fatores avaliados positiva ou negativamente pelos internautas. Ao utilizar as ferramentas de “curtir” e “não curtir” os pesquisadores avaliaram sentimentos de aprovação ou reprovação do conteúdo dos vídeos, e espera-se que essas informações possam contribuir para futuras intervenções nos prejuízos do consumo nocivo de álcool.

Foram então selecionados os 70 vídeos mais relevantes (segundo seleção do próprio site) e populares (segundo busca pelos mais vistos) do YouTube. Os vídeos foram classificados de acordo com 42 características, em 6 categorias: características do vídeo, caráter sociodemográfico, apresentação do álcool, intensidade de uso, características associadas ao álcool e às consequências do uso dessa substância.

Os vídeos selecionados tiveram mais de 330 milhões de visualizações, sendo que cada um recebeu, em média, aproximadamente 1600 “curtidas” e apenas 33 “não curtidas”. Enquanto 89% dos vídeos envolviam homens, mulheres apareceram em 44%. As bebidas que mais apareceram foram os destilados (vodca, uísque, rum, licor, tequila), seguidos de cerveja, vinhos e champanhe, com quase metade (44%) dos vídeos exibindo nome da marca. Em 70% dos vídeos, aspectos de humor estiveram associados, e o uso de veículos automotores em 24%. Houve maior número de aprovações quando o vídeo despertava humor, fazia referência a jogos, continha bebidas destiladas ou alguma marca de bebida alcoólica, insinuava referências de atração física e quando não apresentavam lesões físicas e intoxicação. Constatou-se também que nenhum dos vídeos fez referências a intervenções de saúde pública.

A partir desses resultados, os autores do estudo discutem que o sexo masculino pode ser mais vulnerável a influências por tais vídeos. Ainda, a quantidade de vídeos com bebidas destiladas também é um ponto importante e preocupante, uma vez que o alto teor alcoólico presente nestas bebidas associa-se a maior potencial de danos à saúde, especialmente entre jovens. Em 86% dos vídeos foi retratada intoxicação alcoólica e em 33% padrão de beber pesado episódico, com 7% deles relacionados à dependência ao álcool, levantando a discussão de ser comum que a mídia enfatize o lado divertido do uso de álcool e dê menos importância às potenciais consequências negativas e prejuízos associados.

Como nessa pesquisa foram avaliados apenas vídeos em inglês, uma limitação desse estudo é que esses resultados só podem ser considerados para os países de língua inglesa.

Os autores concluem que vídeos da internet que descrevem a intoxicação pelo álcool são amplamente visualizados e destacam um lado positivo e cômico do beber, que pode levar uma geração a cultivar a falsa percepção dos riscos reais do consumo nocivo de álcool, visto que raramente são retratados os aspectos negativos. Chama a atenção também que a popularidade e ampla visibilidade desse site poderia proporcionar grandes oportunidades para intervenções de saúde pública e campanhas preventivas para juventude.

Perfil do consumo de álcool por idosos brasileiros e fatores associados

CISA – Centro de Informações sobre Saúde e Álcool

O envelhecimento da população brasileira tem sido alavancado pelo aumento da expectativa de vida,diminuição da natalidade e avanços dos serviços de saúde, incluindo o acesso e a disponibilidade de tratamentos. Uma consequência desse fenômeno é a transformação do perfil de saúde da população, com aumento da frequência de doenças crônicas e degenerativas. Estima-se que parte considerável dos idosos brasileiros consome bebidas alcoólicas e sabe-se que este comportamento na terceira idade pode aumentar os riscos de complicações da saúde e mortes, especialmente se excessivo e frequente. Segundo a Organização Mundial de Saúde, não existem níveis seguros para o uso de álcool, e o consumo diário, sem intervalo de ao menos dois dias na semana com abstinência, ou que exceda determinada quantidade, aumenta consideravelmente os riscos de consequências nocivas (para saber mais: http://www.cisa.org.br/artigo/5613/tira-duvidas-sobre-consumo-alcool.php).

No Brasil, cerveja e bebidas destiladas (como uísque, vodca, gin, cachaça) são as bebidas mais consumidas. Para estimar a prevalência do consumo dessas bebidas entre idosos e elucidar fatores associados, foi realizado um estudo transversal com 500 adultos brasileiros residentes em Montes Claros (MG), com idade entre 65-74 anos. O padrão de uso de álcool foi avaliado pela frequência de ingestão (diária, semanal, mensal ou anual), sendo o uso diário ou semanal classificado pelos pesquisadores como “uso frequente”, uma vez que são padrões de maior risco à saúde*.

Observou-se que 27% dos idosos entrevistados consumiam cerveja, 21% bebidas destiladas e 35% bebiam com frequência. Em linha com outros estudos presentes na literatura, o uso de álcool mais frequente e intenso* foi maior entre homens que mulheres.

Foram analisados fatores associados aos tipos de bebida e ao uso frequente, como gênero, estado civil, escolaridade, presença de doenças crônicas e acesso aos serviços de saúde. O consumo de cerveja foi associado ao consumo de tabaco entre mulheres; e menor escolaridade e não ser casado entre homens. Já o consumo de destilados foi associado a menor escolaridade e uso de tabaco entre mulheres; e mais idade e uso de tabaco entre homens. O uso frequente de bebidas alcoólicas foi associado ao consumo de tabaco, o que é bastante preocupante visto que ambas substâncias podem causar danos à saúde, e quando usadas em conjunto apresentam riscos cumulativos.

Os autores concluem que a população idosa estudada tem frequência notável de consumo de álcool, o qual está associado com determinantes demográficos e comportamentais, como o uso de tabaco. Como maior consumo foi observado entre os homens, os pesquisadores sugerem que homens idosos também sejam alvo de campanhas e políticas específicas de prevenção e promoção da saúde. Uma vez que esse estudo foi realizado em apenas um município, os autores destacam que os dados não devem ser considerados como representativos da população idosa brasileira.

*Para saber mais sobre padrões de consumo do álcool, acesse: http://cisa.org.br/artigo/4405/padroes-consumo-alcool.php.

Blecaute alcoólico em jovens de 15 a 19 anos

CISA – Centro de Informações sobre Saúde e Álcool

O padrão de consumo de álcool varia bastante ao longo da vida, observando-se aumento de intensidade e problemas relacionados geralmente entre 15 e 25 anos de idade. Nos Estados Unidos, o primeiro consumo de álcool ocorre em média aos 15 anos e estima-se que, aos 18 anos, 70% já o tenham consumido e que 25% tenham apresentado padrão de beber pesado episódico*. No Reino Unido, um dos países europeus que mais chama atenção no que diz respeito a medidas de uso de álcool, 70% dos estudantes com 14 anos de idade relatam terem consumido álcool. Já no Brasil, a Pesquisa Nacional de Saúde 2013 do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) apontou que 34,5% dos usuários de álcool tiveram o primeiro contato com o álcool entre 15 e 17 anos e 12,5%, antes dos 15 anos.

Um evento adverso comum ao uso abusivo é o lapso de memória ou blecaute alcoólico (BA), definido como a incapacidade de lembrar-se de fragmentos ou períodos inteiros de eventos ocorridos enquanto se está acordado e bebendo. Estima-se que ao menos 50% dos bebedores adultos já tiveram BA, assim como 80% dos indivíduos com transtornos por uso de álcool, sendo um critério avaliado de forma crescente em pesquisas sobre o alcoolismo. Sabe-se também que maior ingestão de álcool (quantidade e frequência) está relacionada a maiores chances de BA.

O componente genético para a herdabilidade do BA (estimada em 50%) parece atuar via diversas características, como pode ser o caso do fenótipo de baixa resposta ao álcool – quando o indivíduo necessita de maiores doses de álcool para atingir determinado grau de intoxicação. Outras características relacionadas ao BA são: sexo masculino, comportamento psicológico externalizante (como impulsividade e busca de sensações), além de convívio com amigos que bebem nocivamente ou usam drogas.

Poucos estudos longitudinais avaliaram o BA até o momento. Um estudo anterior que acompanhou 230 homens por 10 anos identificou que quem mais apresentou episódios de BA foram aqueles que beberam de modo mais frequente e pesado já no início da pesquisa, sendo que esses indivíduos estiveram mais propensos a desenvolver transtornos por uso de álcool. Outro estudo avaliou dois momentos distintos em um período de 4 anos com bebedores entre 19 e 26 anos, e indicou associações de BA com: início do consumo mais precoce, ingestão de maiores quantidades de álcool, ter pais bebedores e hábito de fumar. Quando o indivíduo apresentou BA no início do acompanhamento, sua chance de reincidir em novos episódios no futuro foi de 68%. Por fim, um terceiro estudo demonstrou que indivíduos com uso pesado de álcool e que apresentaram 6 ou mais episódios de BA apresentaram risco dobrado de necessitar de assistência médica em pronto atendimento devido ao consumo de álcool.

O presente estudo acompanhou indivíduos nascidos nas proximidades de Bristol, na Inglaterra, nos anos de 1991 e 1992. Foram incluídos 1402 adolescentes que aos 15 anos já haviam consumido pelo menos uma dose de bebida alcoólica e que tinham sido entrevistados ao menos 2 vezes entre os 15 e 19 anos com relação ao consumo de álcool (quantidade, frequência e efeitos) e frequência de episódios de BA.

Observou-se que aos 15 anos quase 30% dos indivíduos já haviam vivenciado ao menos um episódio de BA, 58% aos 16 anos, 70% aos 18 anos, e alcançando 75% dos indivíduos com 19 anos. Além disso, verificou-se que a quantidade de doses de álcool consumida por ocasião aumentou quase 70% entre os 15 e 19 anos. Assim, nota-se que a frequência de BA tende a aumentar com o avanço da idade e também houve associação de BA com altas quantidades de álcool ingeridas, em linha com achados anteriores.

As trajetórias de ocorrência de BA ao longo do tempo foram heterogêneas e foi possível classificar os participantes em quatro grupos: (1) sem episódio de BA (5%); (2) rápido aumento de BA ao longo dos anos (30%); (3) aumento gradual de BA ao longo dos anos (45%); e (4) BA persistente (21%). Quando comparados, o primeiro grupo (sem BA) era composto por indivíduos que consumiam menos álcool (quantidade e frequência) e tinham perfil de alta resposta ao álcool (sentem mais os efeitos do álcool por dose consumida) no início das avaliações em relação às demais. Já os indivíduos do grupo com BA persistente apresentaram maiores frequências e quantidades de uso de álcool, baixa resposta ao álcool e uso de outras drogas. A Figura 1 apresenta a análise da trajetória longitudinal da proporção de indivíduos que reportaram episódios de BA em cada um dos grupos.

A frequência de BA encontrada no presente estudo (75% aos 19 anos) foi maior que os 50% registrados em estudos americanos para população adulta geral (sem diferenciação por idade) e também em universitários. Uma hipótese que poderia ser feita está ligada ao início precoce presente na amostra (15 anos), considerado preditor de mais problemas relacionados ao uso de álcool no futuro, o que enfatiza a necessidade de medidas educativas e instrutivas específicas para esse público.

Os autores destacam que médicos e pais devem estar atentos ao fato de que para a maioria dos jovens os eventos de BA não são isolados e sua ocorrência é preditiva da trajetória futura de uso nocivo de álcool. É preciso informar que o episódio de BA está associado a altos níveis de concentração de álcool no sangue que podem indicar ou causar problemas de consumo de álcool, além de aumentar as chances de exposição a sexo desprotegido, lesões, acidentes e diversas outras complicações de saúde.

Figura 1: Análise longitudinal dos 4 grupos para ocorrência de blecaute alcoólico (modificado de Schuckit et al. 2014).

*O consumo nocivo está relacionado ao padrão de consumo na forma de beber pesado episódico (BPE), que é(definido pelo National Institute on Alcohol Abuse and Alcoholism (NIAAA) como a ingestão de 5 ou mais doses de álcool para homens e 4 ou mais doses para mulheres em um período de até 2h.

Status do consumo de álcool nas Américas

CISA – Centro de Informações sobre Saúde e Álcool

A Organização Panamericana de Saúde (OPAS, o escritório regional da Organização Mundial da Saúde – OMS, para as Américas) divulgou em julho de 2015 o relatório “Status do consumo de álcool nas Américas”, que examinou os padrões e consequências do uso de álcool nos 36 países da região.

Com dados de 2010 a 2012, corresponde a um primeiro desdobramento do relatório lançado em 2014 pela OMS, que reforça a meta voluntária de redução do consumo nocivo* em 10% até o ano de 2025. Destacou-se a necessidade de novas e mais amplas pesquisas epidemiológicas nacionais consistentes, tendo em vista que a falta de dados oficiais de qualidade é o principal fator limitante do levantamento adequado da questão.

Perfil de consumo

O consumo de álcool na região das Américas é maior do que a média mundial. A frequência do Beber Pesado Episódico** (BPE, também chamado neste relatório de “episódios de consumo excessivo”) nas Américas é de 1 em cada 5 bebedores (22%), enquanto a média mundial é de 16%. Em especial, nos últimos cinco anos houve aumento expressivo do BPE: as mulheres aumentaram de 4,6 a 13% e homens de 17,9 para 29,4%.

Notam-se ainda grandes diferenças entre os gêneros nos países americanos em termos de consumo de álcool. Por exemplo, as mulheres chilenas praticamente não incorrem em episódios de consumo excessivo (0,1%), enquanto entre homens a frequência é de 13,5%. Na Guatemala, por exemplo, homens bebem até 15 vezes mais que mulheres, enquanto no Brasil essa diferença é de 3 vezes.

Com relação aos tipos de bebida, a cerveja é a bebida de preferência nas Américas, ainda que em alguns países caribenhos predomine destilados e em países como Argentina, Chile e Uruguai predomine o vinho.

Álcool e saúde

O uso nocivo de álcool contribui para desenvolvimento de mais de 200 doenças, incluindo lesões, alguns tipos de câncer, infecções – como HIV – e transtornos mentais. É ainda o principal fator associado aos índices de incapacidade e morte entre pessoas de 15 a 49 anos no mundo. Nas Américas, complicações ligadas ao consumo de álcool foram responsáveis por cerca de 300 mil mortes em 2012, das quais 80 mil podem ser diretamente atribuíveis ao uso nocivo de tal substância. Ainda que muitas condições estejam relacionadas ao uso pesado e prolongado, até 35% das mortes e incapacidades têm relação com efeitos agudos do uso excessivo, principalmente acidentes e lesões.

Em 2010, as três principais causas de adoecimento relacionadas ao álcool foram cirrose hepática, transtornos por uso de álcool (TUA) e violência interpessoal. A cirrose foi a principal complicação para ambos os gêneros e os homens tendem a sofrer mais lesões e acidentes. A frequência de TUA nas Américas é relativamente alta quando comparada às demais regiões, sendo equivalente a 9% para homens (atrás apenas dos europeus) e 3,2% para as mulheres (maior que nas demais regiões do mundo).

O Brasil está em 3º lugar no índice de mortalidade atribuível ao álcool entre homens (74 por 100 mil habitantes) e em 11º lugar entre mulheres (12 por 100 mil habitantes). Quando comparados os resultados de 1990 e 2010, nota-se diminuição do índice de mortalidade para mulheres, de aproximadamente 6%, e aumento de aproximadamente 23% para homens. O relatório destaca que, embora tenha ocorrido redução na mortalidade relacionada ao álcool em quase todos os países que compõem a região das Américas, a maior parte das mortes acontece na faixa dos 30 a 59 anos, período em que é esperada maior produtividade pessoal e profissional dos indivíduos.

Juventude

Sabe-se que o consumo de álcool por adolescentes, além de prejudicar a formação do cérebro, aumenta o risco de consequências negativas como gravidez precoce e indesejada, violência, e acidentes. Quanto mais cedo ocorre o primeiro contato com uso de álcool, maiores os riscos de problemas. Por exemplo, consumir a primeira dose antes dos 15 anos aumenta em cinco vezes o risco de desenvolvimento de dependência e em sete vezes o risco de se envolver em acidentes de trânsito ou luta física. Preocupa o fato de que em muitos países americanos a maior parte dos jovens consome a primeira dose aos 14 anos.

Em 2010, cerca de 14 mil mortes de jovens com menos de 19 anos foram atribuídas ao álcool. O Brasil apresenta, entre os países das Américas, o maior índice de mortes relacionadas ao consumo de álcool por adolescentes com idade entre 15 e 19 anos, seguido por Guatemala e Venezuela. Constatou-se que os jovens das Américas costumam ingerir uma ou duas doses a mais por ocasião quando comparado aos adultos. Mais de 60% dos adolescentes homens em sete países (inclusive o Brasil) apresentaram perfil de BPE. Já para adolescentes mulheres os valores são menores; porém ainda elevados em alguns países, chegando ao máximo de 40% no Canadá. A frequência de BPE entre adolescentes na região das Américas só fica atrás da Europa, tanto para mulheres (7,1% versus 22%) como para homens (29,3% versus 40%).

Mulheres

O consumo de álcool pelas mulheres tem crescido em vários países e vem se aproximando ao dos homens, que historicamente sempre foi maior. Sabe-se que as mulheres tendem a apresentar problemas sociais e de saúde ligados ao consumo de álcool com doses menores, pois fisiologicamente são mais vulneráveis, fato que levanta uma série de preocupações tendo em vista esta mudança no perfil das consumidoras de álcool. Como mencionado no tópico Álcool e Saúde, o índice de TUA entre mulheres americanas é maior que no resto do mundo.

Perfil socioeconômico

O perfil socioeconômico da região das Américas é bastante heterogêneo, o que dificulta estudos comparativos entre os países. Apesar disso, constatou-se que em países de menor renda o álcool tem maior impacto negativo na saúde, mesmo se em intensidade semelhante a outros países mais ricos, diferença atribuída ao menor acesso aos serviços de saúde e a estratégias de prevenção com grupos de maior risco.

Povos indígenas

Povos indígenas são muito presentes nos países americanos, representando 13% da população, e são mais vulneráveis às consequências negativas do álcool por questões socioeconômico-culturais. Apesar de escassos, os dados referentes a essa população mostram maior risco para desenvolvimento de TUA, depressão, suicidalidade e outras complicações relacionadas ao álcool.

Álcool e direção

A combinação de álcool e direção é uma das principais causas de morte em jovens no mundo. A criação de limites de concentração sanguínea de álcool máxima permitida é considerada outra medida efetiva para redução do número de acidentes no trânsito.

No Brasil, a mudança da legislação relacionada ao beber e dirigir vem ocorrendo desde 1998. Atualmente, nosso país é um dos 25 do mundo que estabeleceram a tolerância zero para o consumo de álcool por motoristas e um dos 130 que usam o etilômetro (teste do “bafômetro”) como forma de monitoramento do cumprimento da lei. Alguns países da América ainda não têm limites estabelecidos (Bolivia, Paraguai e alguns caribenhos) e 5 possuem limite acima de 0,04 g/dL, o que é considerado alto por já ser capaz de impactar o risco de acidente.

Apesar das blitz policiais aleatórias serem consideradas custo-efetivas e colaborarem na diminuição de acidentes relacionados ao álcool, sua frequência e formas de execução são fatores essenciais para exercerem tal papel protetor. Assim sendo, o que se observa é que quando não há continuidade nas medidas fiscalizadoras, o impacto na redução de mortes viárias tende a desaparecer, apesar da existência de leis. Segundo este relatório da OPAS, o Brasil ainda apresenta altos índices de morte no trânsito, a despeito da implementação das medidas restritivas ao consumo de álcool por condutores.

Efeitos do beber pesado no sistema imunológico

CISA – Centro de Informações sobre Saúde e Álcool

O uso de álcool, especificamente quando leva ao estado de embriaguez, foi associado a mais de 30% dos casos de traumas físicos, e entre tais vítimas atendidas nas unidades de emergência, há maior risco para complicações, como doenças infecciosas e resposta inflamatória grave, o que implica maior mortalidade. Estudos em humanos e modelos animais já demonstraram que a intoxicação alcoólica exerce efeitos imunomoduladores com início em algumas horas a dias após a ingestão, quando o álcool no sangue já não é mais detectável. Entretanto, os efeitos imunomoduladores precoces do álcool no sangue ainda não são bem compreendidos.

Com o objetivo de elucidar esta questão, foram recrutados 15 voluntários saudáveis, sem história de problemas por uso de álcool, que mantiveram abstinência de álcool, cafeína e nicotina por ao menos 72 horas antes do teste. No teste, foi consumido álcool em quantidade necessária para atingir concentração alveolar igual ou superior a 0,1% (medido por bafômetro), com repetições dessa medição a cada 30 minutos. Ainda, para verificar a correlação da medida alveolar com a concentração de álcool no sangue, foram coletadas amostras sanguíneas após 20 minutos, 2 e 5 horas a partir do momento em que a concentração alveolar atingiu 0,1%. Todos os participantes atingiram pico de concentração de álcool no sangue entre 20 min e 2 horas, em valor superior a 100 mg/dL (suficiente para haver embriaguez).

A partir do sangue, foram analisadas células do sistema imunológico (monócitos, leucócitos e linfócitos), quantitativa e qualitativamente, e também a responsividade de citocinas (moléculas envolvidas na modulação das respostas imunológicas), isto é, se a produção de citocinas, diante de estímulos previamente estipulados, foi alterada ou não. Os resultados indicaram a ocorrência de estado pró-inflamatório precoce, aos 20 minutos, caracterizado por aumento no número de leucócitos circulantes e resposta inflamátória na produção de citocinas. Já nos tempos de 2 e 5 horas após a ingestão ocorreu estado anti-inflamatório, com diminuição e alteração dos tipos de leucócitos circulantes e resposta anti-inflamatória na produção de citocinas.

Como conclusão, os autores alertam que mesmo um único episódio de intoxicação alcoólica exerce efeitos sobre o sistema imunológico, causando alteração bifásica, isto é, inicialmente estado pró-inflamatório, seguido de estado anti-inflamatório. Os impactos clínicos dessas alterações não são totalmente conhecidos, mas para o caso de vítimas de traumas e acidentes com elevada concentração de álcool no sangue, é importante conhecer que haverá maior exposição aos ativadores de inflamação do próprio organismo e aos agentes infecciosos, o que poderia representar risco adicional à saúde.

Consequências neurológicas do consumo intermitente de álcool na adolescência

Centro de Informações sobre Saúde e Álcool (CISA)

Estudos em humanos já comprovaram que o uso excessivo de álcool durante a adolescência pode causar déficit cognitivo na vida adulta.

Alcoholism: Clinical and Experimental Research, 2015 Apr 27*

A adolescência é um período crítico do desenvolvimento cognitivo, emocional e social em que ocorre o refinamento de circuitos neurológicos e o amadurecimento de funções cerebrais importantes, como planejamento e memória. Portanto, o uso de álcool – que atua no sistema nervoso central – nesta fase não é aconselhável. Apesar disso, sabe-se que o consumo abusivo de álcool por adolescentes não é incomum e pode levar a consequências graves e irreversíveis.

Estudos em humanos já comprovaram que o uso excessivo de álcool durante a adolescência pode causar déficit cognitivo na vida adulta, com comprometimento de regiões responsáveis pela memória (hipocampo). Sabe-se também que o efeito do álcool em adolescentes é diferente que em adultos, atuando de maneira negativa em funções de aprendizado, coordenação motora e sedação.

Por meio da criação de um modelo animal de ratos adolescentes, um estudo investigou os efeitos do álcool no cérebro em formação desses ratos e averiguou a exposição ocasional e intermitente deles ao álcool com o objetivo de identificar possíveis alterações estruturais e funcionais na fase adulta. Foram avaliadas regiões cerebrais associadas ao aprendizado e a memória utilizando-se técnicas de eletrofisiologia, imunohistoquímica e anatomia, comparando-se ratos adultos que consumiram com aqueles que não consumiram álcool durante a adolescência.

Os resultados obtidos demonstraram que há prejuízo na função de memória na vida adulta quando ocorre exposição precoce ao álcool. Ratos expostos ao álcool apresentaram mais alterações cerebrais, apontando disfunção quando comparados com ratos não expostos ao consumo de álcool (como atraso no início do desenvolvimento de áreas específicas, alterações de plasticidade, densidade de proteínas, maturação de células e sinapses). Em conjunto, esses resultados demonstram que a exposição intermitente de álcool durante a adolescência pode ter consequências persistentes na vida adulta, com anormalidades estruturais e funcionais do hipocampo, área implicada com a memória. No entanto, apesar de avanços significativos na elaboração de modelos animais, são necessários outros estudos para verificar a hipótese em humanos.

Longas jornadas de trabalho estão relacionadas a maior consumo de álcool

Centro de Informações sobre Saúde e Álcool (CISA)

O ambiente de trabalho é um local importante para prevenção do uso de álcool tendo em vista que mais da metade da população adulta é de trabalhadores

O ambiente de trabalho é um local importante para prevenção do uso de álcool tendo em vista que mais da metade da população adulta é de trabalhadores. Intervenções que visam conscientizar sobre o consumo de álcool são importantes nesse âmbito para prevenir os potenciais prejuízos como absenteísmo, baixo rendimento e acidentes de trabalho.

O chamado “consumo de risco” (definido em alguns estudos como mais de 14 doses* de álcool por semana para mulheres ou mais de 21 doses por semana para homens) aumenta a chance de consequências negativas para o indivíduo e para sociedade – desde doenças do fígado, desenvolvimento de alguns tipos de câncer, doença isquêmica do coração, infarto, transtornos mentais e lesões físicas até consequências sociais decorrentes de problemas familiares, violência, acidentes viários, custos do serviço de saúde, diminuição de produtividade e até exclusão do mercado de trabalho.

Devido à relevância desse tema, pesquisadores elaboraram uma revisão sistemática e metanálise incluindo 61 estudos sobre uso de álcool e jornada de trabalho, realizados entre os anos de 1970 e 2013. O objetivo foi avaliar a associação entre a duração da jornada de trabalho e a intensidade e padrão de consumo do álcool. Os estudos levantados, em conjunto, reuniram informações provenientes de quase 195 mil indivíduos oriundos de 14 países (Alemanha, Finlândia, Bélgica, Japão, EUA, Canada, Austrália, Reino Unido, Nova Zelândia, Dinamarca, Taiwan, França, Espanha e Suécia). Os trabalhadores avaliados eram operários de indústria, funcionários de empresas, funcionários públicos, enfermeiros, trabalhadores de transportes, engenheiros de tecnologia da informação, policiais, gerentes e profissionais com ensino superior.

O principal resultado encontrado foi uma relação direta entre longas jornadas de trabalho e maior consumo de álcool, sem relação com o sexo, idade, condição socioeconômica ou região geográfica. Ressalta-se que indivíduos que trabalhavam mais de 48 horas na semana apresentaram risco aumentado de vir a ser um consumidor de risco no futuro.

Pensando na proteção do trabalhador, a comissão da União Europeia sobre Jornada de Trabalho estabelece para seus países membros o limite máximo de 48h semanais. Apesar disso, é comum a prática de jornadas maiores por opção própria ou pressão externa. Apesar de ser frequente que os profissionais com maiores salários e responsabilidades, como gerentes e executivos, trabalhem mais horas, não foi encontrada correlação entre maior jornada de trabalho e maior risco de consumo de álcool, de acordo com os diferentes perfis socioeconômicos.

Os autores acreditam que fatores individuais e ambientais sejam responsáveis pela relação entre a longa jornada de trabalho e maior chance de consumo de risco de álcool, e destacam que um desses fatores seria o aspecto de beber para aliviar o estresse associado à alta demanda e perda de controle. Sugerem também que trabalhadores que não estão bem integrados ou supervisionados pela empresa apresentariam maior risco de desenvolver problemas relacionados ao uso de álcool. Ainda, sintomas de depressão, alterações de sono e traços de personalidade também contribuem para a exposição individual ao consumo de risco. Para concluir, indicam que intervenções breves e preventivas no ambiente de trabalho podem reduzir o consumo de risco e problemas por uso de álcool, e ressaltam a necessidade de mais estudos para compreender melhor a relação encontrada.

*A Organização Mundial de Saúde (OMS) estabelece que uma unidade de bebida ou dose padrão contém aproximadamente de 10 g a 12 g de álcool puro, o equivalente a uma lata de cerveja (330 ml) ou uma dose de destilados (30 ml) ou ainda a uma taça de vinho (100 ml).

Manifestações de recuperação cerebral após abstinência de álcool

Centro de Informações sobre Saúde e Álcool (CISA)

Há dúvidas entre os especialistas sobre a reversibilidade dos danos causados pelo álcool no cérebro

Brain, 130, 36-47, 2007*

O alcoolismo está associado com aumento na morbidade e na mortalidade afora danos significativos aos tecidos cerebrais. Em especial, essa doença acarreta danos às massas branca e cinzenta, seguidos de perda de volume cerebral e perdas neuropsicológicas.

Estudos comparando o cérebro de alcoolistas com sujeitos não-alcoolistas demonstram haver no primeiro grupo menores níveis de N-acetil aspartato (marcador neuronal cuja concentração diminui quando há lesão encefálica) e de colina (substância que reveste a membrana das células nervosas do cérebro e que é precursor da acetilcolina, neurotransmissor relacionado às funções de aprendizado e memória). Ademais, há dúvidas entre os especialistas sobre a reversibilidade desses danos causados pelo álcool no cérebro.

Assim, os autores buscaram investigar os efeitos morfológicos e neuropsicológicos (com a utilização de técnicas de neuroimagem) da breve abstinência de álcool em 15 pacientes alcoolistas que não necessitaram de medicação para se abster do álcool e que não eram fumantes pesados. A título de comparação, 10 voluntários saudáveis foram selecionados para compor o grupo controle.

Após período de 6-7 semanas de abstinência, observou-se no grupo de alcoolistas abstinentes ganho volumétrico global no cérebro de até 1,85% associado com melhora neuropsicológica e metabólica (melhora nos testes de atenção e aumento nos níveis de colina e de N-acetil aspartato). Por fim, os autores constataram que a reversibilidade dos danos se deu principalmente na massa branca do cérebro.

Os autores ressaltam a importância do fato de que a melhora detectada nos exames não se deve apenas a re-hidratação cerebral, mas possivelmente são frutos da capacidade de regeneração cerebral.

Álcool e trabalho

Centro de Informações sobre Saúde e Álcool (CISA)

O uso abusivo de álcool pode ocasionar não somente prejuízos pessoais e familiares, mas também prejuízos no ambiente profissional, como diminuição na produtividade, aumento de absenteísmo (falta ao trabalho), maior probabilidade de acidentes de trabalho, entre outros.

Dados do II Levantamento Nacional de Álcool e Drogas (LENAD) revelaram importante mudança no padrão de consumo na população adulta brasileira em um período de 6 anos (2006 – 2012). Entre as pessoas que bebem, houve aumento de 20% na proporção de bebedores frequentes (que bebem uma vez por semana ou mais) e de 31% no beber em binge, considerado um padrão nocivo de consumo de álcool (4 doses* de álcool para mulheres e 5 doses para homens, em período de 2 horas). Foi observado ainda que 32% da população bebem moderadamente, 16% fazem uso nocivo e, entre os bebedores, 17% apresentam critérios para abuso e/ou dependência de álcool.

Neste contexto, é importante esclarecer que o uso abusivo de álcool é um dos problemas mais sérios de saúde pública no Brasil e no mundo inteiro. Apesar de estudos científicos destacarem o consumo abusivo do álcool como causa de desemprego, o contrário também tem sido evidenciado de modo consistente; ou seja, o desemprego levando ao aumento do consumo de álcool e o risco de desenvolver abuso ou dependência alcoólica.

Em termos gerais, o uso abusivo de álcool pode ocasionar não somente prejuízos pessoais e familiares, mas também prejuízos no ambiente profissional, como diminuição na produtividade, aumento de absenteísmo (falta ao trabalho), maior probabilidade de acidentes de trabalho, entre outros. O II LENAD também mostrou que 8% (7,4 milhões de pessoas) admitiram que o uso de álcool teve efeito prejudicial no seu trabalho, enquanto 4,9% (4,6 milhões de pessoas) relataram já ter perdido o emprego devido ao consumo de bebidas alcoólicas.

De acordo com a Organização Internacional do Trabalho (OIT), agência das Nações Unidas de informação, análise e orientação sobre o trabalho, de 20% a 25% dos acidentes de trabalho no mundo envolvem pessoas que estavam sob o efeito do álcool ou outras drogas. Além disso, os prejuízos do uso de álcool no ambiente de trabalho acarretam custos enormes para a economia do país.

Ao contrário do que muitos acreditam, mesmo em pequenas quantidades, o álcool pode causar prejuízos à performance, qualidade e segurança no trabalho, pois é uma substância depressora do Sistema Nervoso Central cujos principais efeitos a curto prazo envolvem:

  • Prejuízo do julgamento e da crítica;
  • Prejuízo da percepção, memória e compreensão;
  • Diminuição da resposta sensitiva e retardo da resposta reativa;
  • Diminuição da acuidade visual e visão periférica;
  • Incoordenação sensitivo-motora, prejuízo do equilíbrio;
  • Sonolência.

Outros fatores no ambiente de trabalho também podem contribuir para o uso do álcool. Por exemplo, diversos estudos mostram que o estresse tem um papel importante na relação entre álcool e trabalho, sendo que os trabalhos mais estressantes (posições com maiores responsabilidades) influenciariam mais o uso de álcool e transtornos relacionados (abuso e dependência).

As mulheres acabam sendo ainda mais prejudicadas que os homens quando se trata do impacto da demanda excessiva de trabalho, pois frequentemente enfrentam uma dupla jornada de trabalho ao chegar em casa (como cuidados com os filhos e afazeres domésticos).

Cabe ressaltar que, por ser considerada uma doença crônica, há uma proposta para que o trabalhador dependente de álcool tenha direito à proteção do Estado. O projeto de lei do Senado (PLS 83/2012) exclui da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT – Decreto-Lei 5.452/1943) a possibilidade de demissão nesse caso. O projeto estabelece ainda que o trabalhador acometido pelo alcoolismo só poderá ser demitido se não aceitar se submeter a tratamento médico ou psicológico para sua recuperação.

Com tudo isso em mente, a preocupação com o abuso do álcool por trabalhadores é coerente e envolve diferentes aspectos. Por isso, o encaminhamento de trabalhadores com uso problemático de álcool aos serviços de saúde é de suma importância. No entanto, é necessário ir mais fundo: programas preventivos direcionados àqueles que ainda não desenvolveram um transtorno relacionado ao uso de álcool, porém já apresentam problemas decorrentes do uso dessa substância.

*A Organização Mundial de Saúde (OMS) estabelece que uma unidade de bebida ou dose padrão contém aproximadamente de 10 g a 12 g de álcool puro, o equivalente a uma lata de cerveja (330 ml) ou uma dose de destilados (30 ml) ou ainda a uma taça de vinho (100 ml).

Fatores de risco para a dependência alcoólica

Centro de Informações sobre Saúde e Álcool (CISA)

Abuso infantil, problemas conjugais, desemprego, baixo nível educacional, determinadas etnias e aculturação têm sido considerados fatores psicológicos de risco para o alcoolismo

A.T.A. Cheng; S-F. Gau; T.H.H. Chen; J-C. Chang; Y-T. Chang*

Essa doença apresenta fatores de risco significativamente mais elevados para adolescentes e homens adultos e para sujeitos com histórico familiar de alcoolismo.

Ademais, abuso infantil, problemas conjugais, desemprego, baixo nível educacional, determinadas etnias e aculturação têm sido considerados fatores psicológicos de risco para o alcoolismo. Há também a correlação da dependência de álcool com comorbidades, em especial transtornos de ansiedade e depressivos. Assim, a ingestão de álcool funcionaria como uma espécie de auto-medicação.

Estudos sobre o tema indicam que os homens apresentam maior tendência a beber mais precocemente e em maiores quantidades que as mulheres e também a manifestar tanto alcoolismo quanto problemas associados ao uso de álcool. Os estudos envolvendo aspectos genéticos que predispõem ao alcoolismo apontam para influência também dos genes envolvidos com a ação enzimática de metabolização do álcool.

O alelo ativo ADH2*2 é fator de proteção contra a instalação do alcoolismo, sendo predominante em populações asiáticas. Em duas pesquisas longitudinais envolvendo populações aborígines, encontrou-se elevada prevalência de abuso e dependência de álcool (33,9% e 36,4% para homens e 17,8% e 9,8% para mulheres, respectivamente).

Constatou-se também uma frequência baixa (0,02%-0,05%) do alelo inativo da enzima metabolizadora do álcool ALDH2*2 e frequência elevada (0,94%-1,00%) do alelo ativo do ADH3*1 no grupo normal de controle de sujeitos. Esses resultados indicam que nem o ALDH2 nem o ADH3 podem ser usados para examinar o risco para o alcoolismo em termos individuais. Notou-se também nesses estudos que o alelo ADH2 parece desempenhar um papel mais importante do que o alelo ADH3 como fator de risco no alcoolismo.

Os objetivos do estudo foram investigar os efeitos individuais e combinados dos fatores genéticos, socioculturais e psiquiátricos em casos de alcoolismo em uma amostra de aborígines.

A amostra foi composta de 4 grupos de indivíduos de etnia malaio-polinésia. A fase 1 do estudo apresentou taxa de resposta de 98,3%. O trabalho de campo consistiu em observação participante (o pesquisador participa da comunidade, porém evita se tornar “nativo”) das comunidades e entrevistas detalhadas dos indivíduos da amostra.

A entrevista consistiu em uma avaliação psiquiátrica completa sobre alcoolismo e outras comorbidades e também coleta de dados demográficos e sociais da amostra e de informantes-chave (pessoas que têm contato com os indivíduos da amostra e que, portanto, podem fornecer uma visão global do fenômeno). A fase da pesquisa apresentou taxa de resposta de 99,6% dos entrevistados. A amostra consistiu de 499 sujeitos que não apresentaram transtorno relacionado ao uso de álcool, segundo o DSM III-R, na fase anterior. Vinte e seis sujeitos haviam falecido e 8 foram excluídos devido à falta de dados socioculturais. Desse modo, a amostra final foi de 491 sujeitos com tempo médio de duração do follow-up de 4,3 + 5 anos. Buscou-se também analisar a influência do gene ADH2 em casos de alcoolismo na coorte normal.

Houve predomínio de mulheres na amostra (69,7%). Os homens, em comparação com as mulheres, eram mais jovens, mais frequentemente estavam inseridos no mercado de trabalho e apresentavam mais anos de estudo. A idade média nos 4 grupos variou de 31 a 38 anos entre homens e 37 a 41 anos entre as mulheres. Trinta e oito das 342 mulheres (11,1%) e 41 de 149 (27,5%) dos homens eram casos recém detectados de alcoolismo.

A idade média de instalação da doença foi de 26,5 anos para homens e 29,5 anos para mulheres. Em termos gerais, os homens e os jovens de 15 a 24 anos apresentaram maior risco de desenvolvimento do alcoolismo. Ademais, houve maior risco de manifestação da dependência de álcool para aqueles que eram solteiros, com melhor nível de instrução, empregados e com histórico familiar de alcoolismo em parentes de primeiro grau.

Não houve nenhuma correlação significativa entre presença de doença mental e alcoolismo. Mesmo assim, há indícios de confirmação da hipótese de auto-medicação para os transtornos de ansiedade. Os sujeitos do sexo masculino com o genótipo contendo os alelos 1 ou 2 do gene menos ativo ADH2*1 apresentaram risco significativamente maior para o alcoolismo.

Em termos de aspectos genéticos, o alelo ADH2*2 teve ação protetora para o alcoolismo entre os homens aborígines.

Em suma, há indícios neste estudo que confirmam a hipótese de que a vulnerabilidade genética e o sofrimento psicológico são fatores de risco para o alcoolismo.

Constatou-se no estudo que a vulnerabilidade genética esteve relacionada com o gênero sexual e o estresse psicológico interagiu com a idade da amostra.