Efeitos do consumo precoce de álcool na vida adulta

Centro de Informações sobre Saúde e Álcool (CISA)

Inúmeros estudos apontam que o consumo precoce de álcool está associado a complicações na vida adulta

Irons DE, Iacono WG, McGue M*

Inúmeros estudos apontam que o consumo precoce de álcool está associado a complicações na vida adulta, como doenças, comportamentos antissociais, maior frequência de abuso e dependência do álcool, além do uso e abuso de outras substâncias psicoativas. Tal percepção tem orientado as políticas e esforços para prevenir o consumo precoce de álcool por adolescentes. Apesar de tal associação ter sido estabelecida, é necessário compreender se existe uma relação verdadeira de causalidade, ou se tanto o uso precoce como desfechos negativos na vida poderiam decorrer de fatores preexistentes em comum.

Com objetivo de esclarecer essa questão, o presente estudo acompanhou mais de 1500 gêmeos (tanto dizigóticos quanto monozigóticos), avaliados aos 11, 14 e 24 anos e investigou se o beber precoce teria consequências no perfil de uso quando adulto (para álcool e outras substâncias) e outros resultados sociais relacionados, quando ajustados os fatores confundidores, permitindo conclusões mais acuradas. Para essa análise específica foram criados dois escores: de propensão e de controle de gêmeos. A partir do primeiro puderam ser controlados fatores pessoais, familiares e sociais, como escolaridade, comportamento, uso de substâncias pelos pais e outros; e pelo segundo são consideradas, por método estatístico adequado, algumas influências mais difíceis de serem mensuradas, como aspectos genéticos e diferenças quanto ao compartilhamento de fatores ambientais e sociais pelos irmãos.

Os resultados sugerem que, mesmo com o ajuste para potenciais fatores de confusão, a exposição e intoxicação por álcool na adolescência mantiveram associações causais sobre as medidas de uso e abuso de álcool e outras drogas quando adultos, além de outros comportamentos externalizantes, como sintomas antissociais, estresse gerado por atitudes individuais e problemas interpessoais. Ainda, o gêmeo que bebeu primeiro apresentou risco mais elevado que o irmão não exposto para boa parte dos resultados na vida adulta, como a intensidade do uso de álcool, por exemplo. Em relação à independência e função social quando adulto, não foi encontrada relação com consumo precoce de álcool quando excluídos os fatores de confusão.

Conclui-se que a exposição precoce ao álcool funciona como forte preditor de problemas por uso de álcool na vida adulta, e que parte dos mecanismos envolvidos implica em relação direta de causa e consequência, apesar de não serem todos. Por fim, os autores se referem à existência de outros fatores confundidores ainda desconhecidos para os quais serão necessários estudos futuros.

No Dia Nacional do Controle do Alcoolismo e no Dia Nacional de Combate ao Fumo (28 e 29 de agosto), vale reforçar: álcool e tabaco são as drogas mais consumidas no mundo, e são as que mais matam precocemente. Prevenir é a solução!

ABEAD

O álcool e o tabaco são as drogas mais consumidas no mundo, e vale reforçar que são as que mais matam. Nesta semana, data que marca o dia Nacional do Controle do Alcoolismo (28/08) e o dia Nacional de Combate ao Fumo (29/08), a Associação Brasileira de Estudos do Álcool e Outras Drogas (ABEAD) faz um alerta: por ano, cerca de 200 mil brasileiros morrem devido a doenças relacionadas ao cigarro, e o Brasil é o 5º no mundo com maior número de óbitos ligados ao consumo de bebidas alcoólicas, segundo dados do Ministério da Saúde e da Organização Mundial da Saúde (OMS).

De acordo com a presidente da ABEAD, Ana Cecilia Marques, as políticas preventivas são o melhor caminho para evitar que drogas lícitas ou ilícitas continuem fazendo cada vez mais vítimas. No caso do álcool, a médica psiquiatra explica que o país tem um consumo per capita de etanol muito alto, que produz um impacto individual, familiar, social e econômico sem precedentes. “A garantia do bem estar comum deve estar acima de tudo, e esta é a melhor política”, opina.

Dra. Ana Cecília enfatiza que a bebida alcoólica tem afetado a saúde especialmente dos jovens adultos. “Do consumo do álcool e do tabaco desenvolvem-se outras doenças crônicas não comunicáveis, violência interpessoal, doméstica, contra crianças e auto infringida, doenças mentais, acidentes no trânsito, entre outras consequências que geram incapacidade e morte precoce”, afirma.

Sobre o fumo, a especialista aponta para o investimento da indústria, que por meio de grandiosos projetos de comunicação e marketing, investe no aumento do consumo, que resulta em graves consequências. “O cigarro possui mais de 4,5 mil substâncias tóxicas e está diretamente associado a vários tipos de câncer, além de doenças pulmonares, coronarianas e acidente vascular cerebral”. Dados divulgados pela Aliança de Controle do Tabagismo no Brasil (ACTBr) mostram que, após 10 anos sem cigarro, o risco de sofrer infarto será igual ao de quem nunca fumou, e o de desenvolver câncer de pulmão cai pela metade.

A psiquiatra explica que o tratamento é composto por 5 etapas, pois trata-se de uma doença complexa, e envolve desintoxicação e diagnóstico da gravidade e de suas complicações; estabilização, prevenção de recaída e orientação familiar concomitante. A farmacoterapia é utilizada, assim como os grupos de autoajuda. “O importante é procurar tratamento especializado, pois a doença é tratável”, explica Dra. Ana Cecilia Marques.

Bebida alcoólica com energético pode elevar pressão e levar à morte, avisam médicos

No Carnaval, o ideal é beber com moderação para evitar problemas à saúde

Muitas vezes, a folia de Carnaval é embalada com bebida alcóolica, seja nos bloquinhos de rua, no sambódromo ou no clube. Mas tome cuidado, o abuso ou excesso, principalmente dos adolescentes pode prejudicar à saúde. O álcool pode trazer diversos problemas ao sistema nervoso central e até a morte.

As consequências do álcool do cérebro do adolescente são “muito piores” que nos adulto, explica a psiquiatra e presidente da Abead (Associação Brasileira de Estudos do Álcool e outras Drogas) Ana Cecília Marques. Segundo ela, a substância pode “provocar atrofia em áreas importantes do cérebro, que faz com que a pessoa amadureça”.

— Além de afetar todo o sistema nervoso central, o álcool também mexe com sistema cardiovascular, ou seja, as pessoas ficam mais vulneráveis a ter AVC (acidente vascular cerebral). Esse rompimento de artérias pode deixar a pessoa com sequela ou levar à morte. A bebida em excesso está associada muitas vezes casos de violência, relação sexual sem camisinha, entre outros.

Durante o Carnaval é muito comum as internações decorrentes de coma alcoólico, segundo a professora do Departamento de Medicina Preventiva da Unifesp (Universidade de São Paulo), Zila Sanches. Segundo ela, o coma acontece quando há intoxicação decorrente do excesso de consumo e faz a pessoa sofrer “um apagão”.

— O coma é reversível, mas depende do estrago. O tratamento é realizado na UTI (Unidade de Treinamento Intensiva).

Mistura álcool e energético

Além do uso do álcool, a médica cardiologista e presidente da Socerj (Sociedade de Cardiologia do Estado do Rio de Janeiro), Olga Ferreira de Souza, alerta para a mistura do álcool com energético, bebida comum nestes dias de festa Em excesso, a combinação pode levar ao aumento da pressão arterial, palpitações, arritmias cardíacas, e até AVC e a morte súbita.

— Os energéticos escondem os sintomas de embriaguez, pois são estimulantes, contêm cafeína e taurina que mascaram os efeitos do álcool. Os energéticos permitem que a pessoa beba por mais tempo e em maior quantidade.

A professora Zila explica que o “energético mascara os efeitos do álcool, assim faz com que a pessoa beba mais e não sinta os efeitos do seu consumo”. Portanto, a pessoa se sujeita a embriaguez e todos os riscos que isto acarreta, como redução de reflexos, riscos de quedas e acidentes, risco de dependência e risco de morte.

Um estudo realizado pela Unifesp mostra que a cafeína presente nos energéticos potencializa o efeito maléfico do álcool no cérebro e pode provocar envelhecimento precoce e a doenças como Mal de Alzheimer e de Parkinson.

De acordo com Olga, portadores de doenças do coração podem ter mais problemas ao consumir a mistura.

— O jovem não faz habitualmente avaliação clínica e cardiológica que nos permita dizer se é saudável. O risco é enorme para aqueles que são portadores de doenças do coração, hipertensão arterial e arritmias e também para os que não sabem ter doenças.

Nunca beba em jejum

“Se for beber, que seja de forma moderada, pouca quantidade, evitando bebidas destiladas que possuem maior teor alcoólico”, alerta a cardiologista.

— O ideal é se hidratar periodicamente durante o consumo de bebidas alcoólicas, pois um dos efeitos do álcool é a desidratação das células. Só beba se estiver bem alimentado, nunca em jejum.

Jovens bebem cada vez mais cedo

Além dos problemas de saúde, Ana Cecília diz que as pessoas estão bebendo cada vez mais cedo. E, segundo ela, “inicialmente” isso ocorre por “falta de politica para o álcool”.

— Atendo há mais de 30 anos. Antigamente, atendia paciente alcoólatra com 45 ou 50 anos. Hoje, a partir dos 35 anos, porque se toma cada vez mais cedo. Os jovens estão tendo cada vez mais acesso à bebida. Não existe controle para a venda do álcool. O adolescente tem acesso ao álcool. Não existe campanha preventiva que explicasse bem as consequências do uso do etanol. Se uma mãe soubesse de tudo, iria pegar no pé do filho e dar limites.

Álcool muda o funcionamento do cérebro

Pesquisa Fapesp

O consumo crônico de doses elevadas de álcool muda o funcionamento do cérebro.

Altera a estrutura e aumenta a atividade de uma área cerebral profunda, o núcleo estriado, associada ao comportamento impulsivo e à formação de hábitos. Com o tempo, o funcionamento dessa região passa a prevalecer sobre o do córtex pré-frontal, envolvido na tomada de decisão consciente. A confirmação de que esse mecanismo está associado ao consumo compulsivo e à de–pendência de álcool veio de um estudo de Andrew Holmes, dos Institutos Nacionais de Saúde dos Estados Unidos. Ele e seus colaboradores submeteram camundongos a ciclos que simulavam bebedeiras antes de ver o efeito no cérebro. Por quatro dias seguidos, os roedores passavam 16 horas expostos a uma elevada concentração de etanol vaporizado no ar, intercaladas por 8 horas sem álcool. Esses animais preferiam beber água com álcool nos dias seguintes à água pura. No fim do teste, as células do núcleo estriado dos roedores que passaram pela bebedeira apresentavam mais conexões e eram mais ativas que as dos expostos apenas ao ar (PNAS, 19 de agosto).

Elas estão bebendo mais e sua saúde vem respondendo mal

O álcool seduz, afasta a solidão, dilui o stress, encoraja. Parceiro ardiloso, ele tem levado cada vez mais mulheres para o bar

O enredo quase não varia: no início, parece diversão e demonstração de independência. As mulheres bebem para ficar desinibidas e se relacionar melhor com as pessoas. Os sentimentos de inadequação e vazio desaparecem, a solidão também evapora como mágica. A autoestima cresce na mesma velocidade com que o teor etílico sobe no sangue.Ocorpo se mostra resistente. Amigos e familiares costumam comentar, alguns até em tom de admiração, que elas “bebem como os homens”, porque não revelam sinais de embriaguez facilmente.O que difere de uma história para outra é a maneira como cada mulher descobre que caiu numa armadilha e otempo que demora para pedir ajuda.O que era prazeroso se torna um mergulho profundo no inferno. E não há mais controle; sozinha, ela não consegue parar. “O que eu tenho não é uma deficiência moral”, afirma a brasiliense Lia Araújo Nascimento, 33 anos. “O alcoolismo é uma doença progressiva, incurável e que pode ser fatal. Não deixa marcas só na pessoa que bebe, abre uma ferida na família inteira.O ferimento pode até fechar, mas a cicatriz sempre fica.”

O desejo das outras de só falar sob a condição de ter o nome trocado denota uma das facetas mais cruéis dessa enfermidade:o estigma. “Eu digo para as pessoas próximas que não posso mais beber porque sou alcoólatra”, conta Maria Clara, 37 anos, que atua no departamento de vendas de uma multinacional. “Elas me respondem: `Conta outra, você é engraçada¿. Antes, meu preconceito também não me deixava acreditar nisso. Eu pensava que, por ser loira, bonita e saudável, não aconteceria comigo.” Maria Clara começou a perder o pé da situação na faculdade. Carregava cerveja ou destilado para consumir no trajeto ou nos intervalos das aulas. Esse tipo de comportamento, alertam especialistas, tem se tornado cada vez mais comum.

De acordo com o psiquiatra Arthur Guerra, coordenador do Grupo Interdisciplinar de Estudos de Álcool e Drogas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (USP), de cada dez dependentes, quatro são do sexo feminino. Os números preocupam: há duas décadas, a proporção era de uma mulher para cada dez dependentes. “A expectativa é de que, nos próximos 25 anos,o padrão de consumo seja igual ao masculino”, diz oprofessor Amadeu Roselli Cruz, da Universidade Santa Úrsula, no Rio de Janeiro, que comandou um estudo com 52 mil alunos do ensino médio em 16 estados. Nos anos 1980, lembra ele, as meninas começavam, aos 17 anos, com bebidas adocicadas e de baixo teor alcoólico. Hoje iniciam aos 13 com cerveja e destilados, assim como os homens.

No mundo dos adultos, mudanças econômicas e culturais importantes – como a inserção no mercado de trabalho e o fato de que mais mulheres se tornaram chefes de família – tiveram impacto significativo na saúde delas, e isso ajuda a explicar a busca da bebida como alívio para o stress e a pressão do cotidiano. Além do alcoolismo, doenças associadas ao acúmulo de responsabilidades, como infarto agudo do miocárdio e acidente vascular cerebral, historicamente mais frequentes nos homens, estão em ascensão na população feminina. “Há, ainda, uma questão mercadológica, um estímulo da indústria para que mulheres consumam álcool”, avalia a psiquiatra Ilana Pinsky, professora da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp). “Vende-se a ideia de que temos de fazer tudo igual aos homens, inclusive beber. Mas nosso corpo não aguenta. Não podemos chegar nem perto da quantidade que eles ingerem”, diz.O abuso do álcool se mostra mais nocivo em mulheres, já que elas, geralmente, têm menos massa corpórea e enzimas no fígado para metabolizar a substância.

Uma pesquisa recente da Unifesp revelou que o número de mulheres consideradas bebedoras frequentes, aquelas que ingerem álcool pelo menos uma vez por semana, cresceu 34,5% no período de 2006 a 2012. É um aumento 140% maior do que o registrado entre os homens – sendo que 49% das mulheres admitiram beber “em binge” (quatro doses em apenas duas horas). “Beber em binge é encher a cara”, traduz Ilana, uma das coordenadoras do estudo. “É importante detectar essa situação porque ela sinaliza padrões negativos de consumo, como a possibilidade de a pessoa se envolver em acidentes, tentar o suicídio ou manter hábitos sexuais perigosos.”

Com a vida social mais rica e cheia de opções, as oportunidades de beber também acabaram ampliadas. Executivas estão sempre às voltas com jantares e almoços de negócios onde a oferta de álcool é farta. Happy hours são rotina entre colegas de trabalho. Isso sem contar as baladas, que atraem as mais jovens, e os bares que abrem às 7 da manhã nos arredores das escolas e universidades. Se anos atrás beber era considerado “feio” para as mulheres, e isso ajudava a afastá-las do álcool, hoje o ato é amplamente incentivado. “Mas o homem não costuma ser solidário com a alcoolista. Ele sai da relação antes de a dependência ficar muito visível”, alerta o psiquiatra gaúcho Carlos Salgado, conselheiro da Associação Brasileira de Estudos do Álcool e outras Drogas. “Eu me dei conta do problema no dia em que fiz um escândalo e o meu marido foi embora”, relata a advogada Sara, 43 anos. “Cada um tem o seu fundo de poço.O meu foi obarulho da porta batendo. Pensei: `O que estou fazendo comigo?¿.”Omarido voltou e foi quem mais sofreu com o alcoolismo dela – mais até do que os três filhos, do primeiro casamento. “Minha capacidade de trabalhar foi sendo reduzida e eu fiquei só com um cliente”, recorda-se.

Além de ter o dinheiro encurtado, ela sofreu alguns acidentes de carro. “Um dia, achei que ele tinha ficado de conversa com uma moça. Tomada pelo ciúme, descontei no acelerador. Foi perda total. Bati o carro numa árvore e levei 80 pontos no rosto”, conta. E admite: “Já coloquei a vida de várias pessoas em risco”. Há três anos, Sara está nos Alcoólicos Anônimos (AA) e limpa. “Eu me sinto mais feliz, minhas emoções estão clareando”, garante. Sobre a razão para adotar o copo como companheiro, a advogada diz: “É difícil passar pelos problemas da vida sem ter uma válvula de escape”. Há também aquela velha história: excessivamente cobradas, as mulheres sentem que não podem fracassar. No caso dela, pesou ainda uma dose de orgulho, pois acreditava que uma pessoa com doutorado seria obrigada a dar conta de tudo. Está aí uma sensação que muitas de nós conhecem bem.

Não mais só dos homens, o álcool se mostra, também, companheiro traidor da mulher

O álcool seduz, afasta a solidão, dilui o stress, encoraja. Parceiro ardiloso, ele tem levado cada vez mais mulheres para o bar – e o crescimento do uso entre elas já é 140% maior do que entre os homens

O enredo quase não varia: no início, parece diversão e demonstração de independência. As mulheres bebem para ficar desinibidas e se relacionar melhor com as pessoas. Os sentimentos de inadequação e vazio desaparecem, a solidão também evapora como mágica. A autoestima cresce na mesma velocidade com que o teor etílico sobe no sangue.Ocorpo se mostra resistente. Amigos e familiares costumam comentar, alguns até em tom de admiração, que elas “bebem como os homens”, porque não revelam sinais de embriaguez facilmente.O que difere de uma história para outra é a maneira como cada mulher descobre que caiu numa armadilha e otempo que demora para pedir ajuda.O que era prazeroso se torna um mergulho profundo no inferno. E não há mais controle; sozinha, ela não consegue parar. “O que eu tenho não é uma deficiência moral”, afirma a brasiliense Lia Araújo Nascimento, 33 anos. “O alcoolismo é uma doença progressiva, incurável e que pode ser fatal. Não deixa marcas só na pessoa que bebe, abre uma ferida na família inteira.O ferimento pode até fechar, mas a cicatriz sempre fica.”

Das mulheres que admitiram o alcoolismo em entrevista a CLAUDIA, apenas Lia aceitou mostrar totalmente o rosto e revelar sua identidade (veja ao lado).O desejo das outras de só falar sob a condição de ter o nome trocado denota uma das facetas mais cruéis dessa enfermidade:o estigma. “Eu digo para as pessoas próximas que não posso mais beber porque sou alcoólatra”, conta Maria Clara, 37 anos, que atua no departamento de vendas de uma multinacional. “Elas me respondem: `Conta outra, você é engraçada¿. Antes, meu preconceito também não me deixava acreditar nisso. Eu pensava que, por ser loira, bonita e saudável, não aconteceria comigo.” Maria Clara começou a perder o pé da situação na faculdade. Carregava cerveja ou destilado para consumir no trajeto ou nos intervalos das aulas. Esse tipo de comportamento, alertam especialistas, tem se tornado cada vez mais comum.

De acordo com o psiquiatra Arthur Guerra, coordenador do Grupo Interdisciplinar de Estudos de Álcool e Drogas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (USP), de cada dez dependentes, quatro são do sexo feminino. Os números preocupam: há duas décadas, a proporção era de uma mulher para cada dez dependentes. “A expectativa é de que, nos próximos 25 anos,o padrão de consumo seja igual ao masculino”, diz oprofessor Amadeu Roselli Cruz, da Universidade Santa Úrsula, no Rio de Janeiro, que comandou um estudo com 52 mil alunos do ensino médio em 16 estados. Nos anos 1980, lembra ele, as meninas começavam, aos 17 anos, com bebidas adocicadas e de baixo teor alcoólico. Hoje iniciam aos 13 com cerveja e destilados, assim como os homens.

No mundo dos adultos, mudanças econômicas e culturais importantes – como a inserção no mercado de trabalho e o fato de que mais mulheres se tornaram chefes de família – tiveram impacto significativo na saúde delas, e isso ajuda a explicar a busca da bebida como alívio para o stress e a pressão do cotidiano. Além do alcoolismo, doenças associadas ao acúmulo de responsabilidades, como infarto agudo do miocárdio e acidente vascular cerebral, historicamente mais frequentes nos homens, estão em ascensão na população feminina. “Há, ainda, uma questão mercadológica, um estímulo da indústria para que mulheres consumam álcool”, avalia a psiquiatra Ilana Pinsky, professora da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp). “Vende-se a ideia de que temos de fazer tudo igual aos homens, inclusive beber. Mas nosso corpo não aguenta. Não podemos chegar nem perto da quantidade que eles ingerem”, diz.O abuso do álcool se mostra mais nocivo em mulheres, já que elas, geralmente, têm menos massa corpórea e enzimas no fígado para metabolizar a substância.

Uma pesquisa recente da Unifesp revelou que o número de mulheres consideradas bebedoras frequentes, aquelas que ingerem álcool pelo menos uma vez por semana, cresceu 34,5% no período de 2006 a 2012. É um aumento 140% maior do que o registrado entre os homens – sendo que 49% das mulheres admitiram beber “em binge” (quatro doses em apenas duas horas). “Beber em binge é encher a cara”, traduz Ilana, uma das coordenadoras do estudo. “É importante detectar essa situação porque ela sinaliza padrões negativos de consumo, como a possibilidade de a pessoa se envolver em acidentes, tentar o suicídio ou manter hábitos sexuais perigosos.”

Com a vida social mais rica e cheia de opções, as oportunidades de beber também acabaram ampliadas. Executivas estão sempre às voltas com jantares e almoços de negócios onde a oferta de álcool é farta. Happy hours são rotina entre colegas de trabalho. Isso sem contar as baladas, que atraem as mais jovens, e os bares que abrem às 7 da manhã nos arredores das escolas e universidades. Se anos atrás beber era considerado “feio” para as mulheres, e isso ajudava a afastá-las do álcool, hoje o ato é amplamente incentivado. “Mas o homem não costuma ser solidário com a alcoolista. Ele sai da relação antes de a dependência ficar muito visível”, alerta o psiquiatra gaúcho Carlos Salgado, conselheiro da Associação Brasileira de Estudos do Álcool e outras Drogas. “Eu me dei conta do problema no dia em que fiz um escândalo e o meu marido foi embora”, relata a advogada Sara, 43 anos. “Cada um tem o seu fundo de poço.O meu foi obarulho da porta batendo. Pensei: `O que estou fazendo comigo?¿.”Omarido voltou e foi quem mais sofreu com o alcoolismo dela – mais até do que os três filhos, do primeiro casamento. “Minha capacidade de trabalhar foi sendo reduzida e eu fiquei só com um cliente”, recorda-se.

Além de ter o dinheiro encurtado, ela sofreu alguns acidentes de carro. “Um dia, achei que ele tinha ficado de conversa com uma moça. Tomada pelo ciúme, descontei no acelerador. Foi perda total. Bati o carro numa árvore e levei 80 pontos no rosto”, conta. E admite: “Já coloquei a vida de várias pessoas em risco”. Há três anos, Sara está nos Alcoólicos Anônimos (AA) e limpa. “Eu me sinto mais feliz, minhas emoções estão clareando”, garante. Sobre a razão para adotar o copo como companheiro, a advogada diz: “É difícil passar pelos problemas da vida sem ter uma válvula de escape”. Há também aquela velha história: excessivamente cobradas, as mulheres sentem que não podem fracassar. No caso dela, pesou ainda uma dose de orgulho, pois acreditava que uma pessoa com doutorado seria obrigada a dar conta de tudo. Está aí uma sensação que muitas de nós conhecem bem.

Provar álcool antes de 12 anos aumenta risco de abuso

A pesquisa constatou que um simples gole de qualquer bebida alcoólica feita por crianças menores de 12 anos aumenta em 60% as chances delas, quando adolescentes, consumirem álcool abusivamente.

João tinha 11 anos quando experimentou vinho oferecido pelos pais, em 2008. Aos 15, foi a vez do primeiro pileque, causado pelo consumo excessivo de vodca com energético numa festa com amigos. “Agora, quando chego meio bêbado em casa minha mãe sabe que eu bebi, mas finge que não sabe”, diz o jovem de 16 anos, aluno do 2.º ano do ensino médio de um colégio tradicional de São Paulo.

Hoje, ele diz que consome frequentemente álcool com os colegas. A primeira experiência do estudante com vinho pode explicar e até justificar o seu hábito de consumo atual. É o que revela uma pesquisa inédita da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) feita com base em entrevistas realizadas com 17 mil adolescentes do ensino médio de 789 escolas públicas e privadas de todo o País.

O estudo, feito pelo Centro Brasileiro de Informações sobre Drogas Psicotrópicas (Cebrid) da Unifesp, constatou que um simples gole ou experimentação de qualquer bebida alcoólica feita por crianças menores de 12 anos aumenta em 60% as chances delas, quando adolescentes, consumirem álcool abusivamente. “O contato que a criança tem com bebidas na infância pode não gerar apenas um adolescente que ocasionalmente fica de porre. Ela pode acabar adquirindo o padrão abusivo de consumo de álcool”, afirma Zila Sanchez, professora do Departamento de Medicina Preventiva da Unifesp, uma das pesquisadoras responsáveis pelo estudo.

A pesquisa também constatou que, dentre os estudantes que afirmaram ter consumido algum tipo de bebida alcoólica na vida (82% dos entrevistados), 11% experimentaram antes dos 12 anos. Para a nutricionista Camila Leonel, o consumo precoce tem um impacto claro na saúde do jovem. “O álcool causa modificações neuroquímicas, com prejuízos na memória, aprendizado e controle dos impulsos. O sistema nervoso dos menores ainda está em desenvolvimento”, afirma.

E para evitar o contato inicial com a bebida não basta apenas que os pais proíbam o acesso ao álcool, segundo Ilana Pinsky, vice-presidente da Associação Brasileira de Estudo de Álcool e Drogas (Abead). “Se os pais têm o hábito de beber todos os dias para relaxar, por exemplo, não adianta conversar muito sobre como beber de forma responsável”, diz ela.

Ilana critica a “enorme” quantidade de bebidas que há dentro dos lares de muitos brasileiros. “Os pais têm de ter cuidado com os bares que ficam dentro das próprias casas, para que as crianças não tenham acesso a eles”, diz. Na casa da empresária Cláudia Silva, que tem uma filha menor de idade, não há esse risco. “Aqui em casa é zero álcool. Nada disso de dar só um golinho para experimentar”, diz a mãe.

Propaganda

Mesmo com o controle dos pais, há outros fatores que podem influenciar a entrada precoce do álcool na vida dos menores. “A propaganda de cerveja na televisão, mesmo não sendo direcionada à criança, influencia o consumo. Ela acaba se associando com atividades esportivas, coisas que o adolescente gosta”, afirma Edgard Rebouças, coordenador do Observatório da Mídia, da Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes) e conselheiro do Instituto Alana.

Segundo a Ambev, uma das maiores empresas de bebidas do mundo, o consumo de bebidas por menores é algo que a marca quer evitar. “Esse lucro não nos interessa. Fazemos de tudo para que essa relação do menor com a bebida não aconteça”, diz Ricardo Rolim, diretor de relações socioambientais da Ambev. Ele cita programas da empresa, como o Jovem Responsa, que, em parceria com 21 ONGs de todo o País, já levou orientações de consumo consciente a mais de 57 mil jovens direta e indiretamente.

Para Betânia Gomes, que pesquisou o tema na Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto, da Universidade de São Paulo (USP), faltam políticas públicas mais efetivas sobre a questão. “Precisamos de mais iniciativas oficiais de promoção e campanhas educativas para que esses meninos e meninas não comecem a beber tão cedo”, diz a pesquisadora.

Consumo de bebidas alcoólicas na população adulta brasileira: características sociodemográficas e tendências

Dados da Organização Mundial da Saúde (OMS) mostram que o consumo nocivo de bebidas alcoólicas está associado a uma carga de doenças em todo o mundo, com destaque especial aos países de média e baixa renda – fato que tem incentivado a implantação de estratégias para reduzi-lo. No Brasil, iniciou-se um sistema contínuo de monitoramento chamado VIGITEL* em 2006, possibilitando a avaliação do padrão de uso de álcool na população geral adulta das 26 capitais dos estados brasileiros e do Distrito Federal.

Com base nos dados coletados pelo VIGITEL, um estudo teve como principal objetivo estimar o consumo de álcool no Brasil de 2006 a 2009, identificar as características sociodemográficas associadas, e a tendências de consumo no referido período. Cerca de 54.000 indivíduos foram entrevistados pelo VIGITEL no período de 1 ano, por meio de amostragem aleatória. Foram avaliados no total de 54.369 indivíduos adultos residentes nas capitais do país e no Distrito Federal no ano de 2006, que participaram do sistema VIGITEL*. Para verificar o consumo de álcool, o estudo considerou dois padrões de uso: habitual (ingestão de bebida alcoólica nos últimos 30 dias, independentemente da dose) e abusivo (consumo de 5 ou mais doses para homens e 4 ou mais doses para mulheres em uma ocasião, nos últimos 30 dias).

Os resultados mostraram que quase 40% dos brasileiros fazem uso habitual de álcool, sendo que 42% destes o fazem de forma abusiva (16% do total de entrevistados). Verifica-se ainda que homens consomem mais que as mulheres, tanto no padrão habitual como no abusivo (2 vezes e 3 vezes mais, respectivamente).

Ainda, verificou-se que o consumo de álcool no Brasil é maior e mais abusivo entre adultos jovens, principalmente homens, com idades entre 18 e 44 anos – havendo um declínio após essa faixa etária -, sem engajamento em relacionamento afetivo e inseridos no mercado de trabalho. A escolaridade esteve associada apenas ao consumo habitual, aumentando nas faixas de menor e maior escolaridade, respectivamente.

De acordo com os autores, o aumento do uso abusivo encontrado neste estudo pode ser justificado pela própria cultura brasileira, que aceita socialmente a ingestão de álcool, porém a dose limite para o uso nocivo não é clara – especialmente para a população mais jovem. Desta forma, apontam a urgência de políticas públicas nacionais voltadas para a prevenção do consumo excessivo, principalmente junto a essa população.

* O sistema VIGITEL (Vigilância de Fatores de Risco e Proteção para Doenças Crônicas por Inquérito Telefônico) tem como objetivo monitorar a frequência e a distribuição de fatores de risco e proteção para as Doenças Crônicas Não Transmissíveis, através de entrevistas telefônicas realizadas em amostras probabilísticas da população adulta brasileira. Saiba mais: http://portal.saude.gov.br/portal/saude/profissional/area.cfm?id_area=1521.

Fonte: http://www.cisa.org.br

Estudo aponta que acreditar estar bêbado aumenta a autoestima

Uma equipe internacional de cientistas provou por meio de um estudo divulgado nesta quinta-feira que apesar de as pessoas se sentirem mais sedutoras conforme a quantidade de álcool que ingerem, a melhora da percepção sobre si mesmo não é consequência das bebidas, mas de um efeito “placebo” causado pelo álcool.

O estudo, intitulado “Beauty is in the eye of the beer holder” (A beleza está no olho do que segura a cerveja), aborda o papel do álcool no grau de atração que cada pessoa atribui a si própria e para sua aplicação foi utilizado um grupo de pessoas em um laboratório e em um bar, segundo publicou nesta quinta-feira a Universidade Paris Descartes.

O estudo levantou duas hipóteses: o consumo melhoraria o grau de atração que cada pessoa confere a si própria, ou haveria respostas mais polarizadas que fizessem com que aqueles que se considerassem interessantes reforçassem essa crença, enquanto aqueles que não tivessem a mesma visão positiva se afundariam em seus defeitos.

Na primeira parte, feita com 19 pessoas em um bar, os participantes foram orientados a declarar o quão atraentes, brilhantes, originais e divertidos se consideravam, e ao aumentar a quantidade de álcool ingerida a opinião sobre eles próprios também melhorou.

Na segunda parte, realizada com 86 pessoas, foi entregue aleatoriamente aos voluntários bebidas que continham ou não álcool. Enquanto metade foi levada a acreditar que havia consumido bebidas alcoólicas, a outra metade pensava o contrário.

Esses últimos foram levados a crer que estavam degustando uma nova bebida de uma empresa falsa que ia ser lançada no mercado, e foi pedido que escrevessem uma mensagem publicitária que supostamente ia ser utilizada pela empresa para promover o produto.

Os participantes apresentaram posteriormente sua estratégia, em uma exposição gravada e analisada por um grupo independente de 22 juízes.

Os resultados, segundo os dados da Universidade Paris Descartes, mostraram que quem achava que tinha tomado álcool dava a si próprio as melhores notas.

A análise procedente dos juízes, que não sabiam quais participantes eram de cada grupo, constatou que a melhora registrada nas respectivas percepções não estava relacionada com sua verdadeira atuação.

Para os responsáveis do estudo, entre os quais está a Universidade de Ohio, estas conclusões confirmam que a crença de ter consumido álcool basta para que a mente atue como se o tivesse feito.

Estudos anteriores demonstravam que o consumo de álcool aumenta a atratividade que uma pessoa vê em outra do sexo oposto, mas com a pesquisa de agora foi provado que também faz com que melhore a opinião sobre si própria, uma visão que, segundo os autores, se limita à de quem bebe, e não é compartilhada pelos demais.

Fonte: EFE – Agência EFE