Expectativas em relação ao álcool e seu uso nas diferentes faixas etárias

CISA – Centro de Informações sobre Saúde e Álcool

Nos últimos anos os modelos psico-sociais relacionados ao uso de álcool passaram a atribuir grande importância às expectativas dos indivíduos em relação as consequências do consumo de álcool. Verifica-se na literatura que as crenças dos indivíduos em relação aos efeitos do álcool no comportamento, humor e emoções estão correlacionadas com o uso de álcool por adolescentes e adultos. A decisão de consumir bebida alcoólica pode ter origem, por exemplo, na crença de que o álcool tem consequências positivas para o indivíduo, tais como o relaxamento e o alívio de tensão.

As expectativas sobre os possíveis efeitos do álcool iniciam-se na infância, muito antes do indivíduo fazer uso de qualquer substancia alcoólica, sendo que a criança constrói um sistema de crenças a partir de suas observações, aprendizado e assimilação de estereótipos culturais. Trabalhos na área concluem que as crianças possuem fundamentalmente uma visão negativa sobre os efeitos do consumo de álcool. No momento em que o indivíduo começa a entrar na puberdade e a ter um contato maior com o álcool, suas expectativas passam a se modificar e aos poucos ele passa a ver de forma positiva os efeitos de seu consumo. A partir da adolescência as mudanças nas expectativas do indivíduo passam a depender do acúmulo de suas experiências relacionadas ao consumo de álcool.

A partir de um levantamento realizado nos Estados Unidos intitulado Pesquisa Nacional sobre o Álcool (National Alcohol Survey) que buscou explorar os hábitos de consumo de álcool e seus problemas, um estudo foi realizado sobre as possíveis correlações existentes entre as expectativas dos indivíduos em relação as consequências do álcool e o seu consumo nas diversas faixas etárias. O trabalho fundamentou-se na idéia de que as expectativas em relação as consequências do uso de álcool dependem do acúmulo da experiência do indivíduo, sendo esperado que a relação entre as expectativas dos indivíduos e o uso de álcool se modifique de acordo com a idade dos indivíduos.

O levantamento incluiu entrevistas com 3168 indivíduos com idades a partir de 12 anos. A média etária da amostra adulta foi de 36 anos, sendo que 58% dos participantes eram mulheres, 76% brancos, 13% negros, 3% asiáticos e 8% hispânicos. Quanto ao consumo de álcool, 7% dos adultos relataram uso de álcool diário, 22% semanal, 21% mensal, 37% reportaram uso de álcool esporádico e 14% disseram nunca ter bebido. A média etária da amostra de adolescentes foi de 15 anos, sendo que 49% eram mulheres, 54% brancos, 18% negros, 3% asiáticos e 13% hispânicos. Dentre os adolescentes, 4% relataram uso de álcool semanal, 14% mensal, 33% relataram uso de álcool esporádico de álcool e 49% disseram nunca ter bebido. A pesquisa utilizou um questionário contendo 27 itens que descreviam tanto os possíveis efeitos positivos quanto os possíveis efeitos negativos do consumo de álcool

Resultados:
Em todas as faixas etárias as expectativas positivas em relação as consequências do consumo de álcool estavam correlacionadas positivamente com o uso de álcool e as expectativas negativas em relação as consequências do consumo de álcool estavam relacionadas negativamente com o consumo de álcool. Identificou-se que para os indivíduos entre 12 e 35 anos de idade as expectativas positivas são um indicador mais forte para o consumo de álcool do que as expectativas negativas para seu não consumo. Este fato não se verifica para as mulheres nas idades entre 36 e 45 anos e para os homens nas idades entre 36 e 60 anos em que tanto as expectativas positivas quanto as expectativas negativas demonstraram ser forte indicadores do uso e do não uso de álcool.

A pesquisa ainda concluiu que expectativas negativas das consequências do consumo de álcool é um forte indicador para possível abstinência de álcool, enquanto que expectativas positivas são um forte indicador para a quantidade de álcool consumido.

Importância dos resultados para programas de prevenção:
Os resultados deste estudo mostram que programas de prevenção que se baseiam na formação de expectativas negativas quanto as consequências do consumo de álcool podem ter pouca efetividade para adolescentes e jovens adultos que já fazem uso de álcool.

Identificação e diagnóstico de problemas relacionados ao abuso de álcool em Hospitais Americanos

CISA – Centro de Informações sobre Saúde e Álcool

Estudo publicado em abril de 2004 na revista Archives of Internal Medicine, mostrou que muitas pessoas admitidas em hospitais gerais nos Estados Unidos apresentam problemas decorrentes do abuso de álcool que passam desapercebidos pela equipe médica. A pesquisa teve como objetivo comparar as proporções de pacientes diagnosticados positivamente para abuso e dependência de álcool em dois diferentes momentos, no processo de admissão e posteriormente durante a internação.

Os pesquisadores Barbara A. Smothers e Harold T. Yahr investigaram aproximadamente 2000 pessoas com o objetivo de diagnosticar problemas relacionados ao uso de álcool. Os autores verificaram que aproximadamente 25% dos pacientes que faziam uso frequente de bebidas alcoólicas apresentavam diagnóstico de abuso ou dependência de álcool de acordo com entrevistas realizadas durante o processo de admissão dos pacientes, seguindo critérios do Manual Estatístico dos Transtornos Mentais da Associação Psiquiátrica Americana (DSM-IV). Ao comparar os resultados da entrevista inicial com os dados dos prontuários hospitalares dos mesmos pacientes, verificou-se que apenas 40.3% dos pacientes que apresentavam diagnóstico de abuso e dependência tiveram estes problemas detectados pelas equipes médicas dos hospitais. Apenas metade dos indivíduos diagnosticados, tanto pelos dados obtidos da entrevista como pelos dados colhidos de registros hospitalares, recebeu tratamento especializado.

Os pesquisadores concluíram que o exame diagnóstico para a detecção de problemas decorrentes do uso de álcool deve ser parte da rotina do processo de admissão nos hospitais e que um esforço deve ser empreendido no treinamento dos estudantes de medicina e médicos residentes bem como na educação continuada dos médicos em exercício da profissão de modo a minimizar este problema.

Atitudes restritivas dos pais pode prevenir o uso de álcool por menores de idade?

CISA – Centro de Informações sobre Saúde e Álcool

O consumo de álcool por menores de idade implica sérios riscos para a saúde, com maior chance de abuso e dependência de álcool e outras substâncias no futuro, para acidentes de trânsito e mortes prematuras. Entre as medidas preventivas ao consumo precoce de álcool, destaca-se uma vertente promissora, cujo foco são pais de adolescentes, com ações realizadas especialmente em escolas. Acredita-se que a alteração do comportamento, normas e atitudes dos pais pode impactar positivamente na redução do consumo de álcool por adolescentes.

A estratégia elaborada pelo programa Örebro Prevention Programme (OPP) consiste em reuniões com pais e professores com 30 minutos de duração, realizadas semestralmente em escolas. Nessas reuniões é indicado que os pais adotem postura de tolerância zero para o consumo de álcool pelos adolescentes, deixando claro para os menores de idade quais são as regras e possíveis sanções aplicadas caso o combinado não seja cumprido. O programa demonstrou resultados positivos em estudos anteriores para a prevenção do uso nocivo de álcool, reduzindo a frequência de episódios de embriaguez.

Com o objetivo de entender o mecanismo responsável pelo sucesso do OPP, o presente estudo analisou qual seria o papel das atitudes restritivas dos pais na obtenção dos resultados positivos, os quais foram redução dos episódios de embriaguez e o retardamento do beber regular (ao menos um episódio de embriaguez por mês). Para isso, 653 adolescentes com idade entre 12 e 13 anos e 524 pais preencheram questionários no início do estudo, após 18 meses e 30 meses. Além disso, variáveis que pudessem confundir os resultados, como gênero, status imigratório, qualidade de relacionamento com pais e uso de álcool por pais e colegas foram incluídas nas análises.

As atitudes dos pais foram classificadas conforme quatro opções, desde “muito lenientes” (consideram natural a curiosidade dos filhos para experimentar álcool e acreditam que fazem uso responsável) até “muito rigorosas” (consideram que menores de idade jamais podem consumir de álcool e nem deveriam se preocupar com isso). Os adolescentes responderam quantas vezes consumiram álcool até se sentirem alcoolizados no último mês, o que foi acompanhado ao longo do estudo para observar mudanças no padrão daqueles que iniciaram o hábito de beber mensalmente. Os adolescentes também responderam com qual frequência observam os pais e colegas consumirem álcool e sobre a qualidade de relacionamento com os pais. Para comparações de resultados, um grupo de pais recebeu a intervenção, isto é, participou das reuniões, e o outro não recebeu.

Constatou-se que no grupo sem intervenção os adolescentes evoluíram com mais episódios de embriaguez, enquanto no grupo com intervenção, adolescentes reduziram a frequência de episódios de embriaguez ou iniciaram mais tardiamente. Como resultado principal, cerca de 50% do resultado positivo do programa foi atribuído às atitudes restritivas dos pais, o que representa um papel robusto. Por outro lado, demais mecanismos adjacentes podem ser fonte de futuras pesquisas. Por exemplo, de forma interessante, os pais que receberam a intervenção mantiveram mais atitudes restritivas ao longo do tempo, enquanto o grupo que não recebeu evoluiu com menos atitudes restritivas frente ao uso de álcool por seus filhos. Além disso, foi observado que pais imigrantes ou que possuem má relação com filho tendem a adotar posturas menos restritivas. Talvez, pais que vivenciam relacionamento ruim com os filhos se sintam menos empoderados e tenham menor expectativa em relação a eles.

Conclui-se que atitudes mais restritivas dos pais, em vigência da intervenção do OPP, criaram ambiente desfavorável ao consumo de álcool e foram assim eficientes na prevenção do uso nocivo, ao reduzir e retardar o consumo de álcool por menores de idade.

Fonte: http://www.cisa.org.br/artigo/6981/atitudes-restritivas-pais-pode-prevenir-uso.php

Crise econômica provoca aumento do número de dependentes de álcool

UNIAD – Unidade de Pesquisa em Álcool e Drogas

LUCILENE OLIVEIRA

DO “AGORA”

A alta taxa de desemprego aliada aos graves problemas financeiros causados pela crise econômica do país são combinações perigosas, que têm levado cada vez mais pessoas à dependência do álcool. A situação é ainda mais crítica entre pessoas que tenham alguma doença associada, como depressão ou quadros de ansiedade, alertam especialistas.

Levantamento feito a pedido da reportagem pela Secretaria Municipal da Saúde, sob a gestão Fernando Haddad (PT), mostra que, no ano passado, o número de pessoas que procurou ajuda nos Caps AD (Centros de Atenção Psicossocial Álcool e Drogas) aumentou 7%. A média diária de atendimento neste ano já é quase o dobro do que a do ano passado. Enquanto em 2015, cerca de 13 pessoas eram atendidas por dia nos Caps, até junho deste ano o número chegou a 25 pacientes diariamente.

O AA (Alcoólicos Anônimos) também disse ter verificado aumento no número de dependentes que buscaram ajuda nos grupos de apoio. As pessoas que dão prosseguimento ao tratamento, no entanto, continua o mesmo, em torno de 5%. “A perda de um emprego pode desencadear [o alcoolismo] de alguém que tenha algo associado, como uma depressão e a crise de ansiedade que não é tratada”, explicou Liamar Ferreira, psiquiatra da equipe de Saúde Mental da Secretaria Municipal da Saúde.

SEM SAÍDA

A taxa de desemprego do país do último trimestre é de 11,2%, o equivalente a 11,4 milhões de pessoas. É a maior taxa da série histórica do IBGE, iniciada em 2012.

Foi justamente a conta bancária no vermelho que levou o empresário J.B., 52 anos, a se entregar à bebida há cerca de 18 anos, período em que resolveu buscar ajuda no AA (Alcoólicos Anônimos).

“Eu não via saída e bebia para me livrar daquilo que não tinha como resolver”, disse J.B. Por ser regra do AA, a sua identidade não pode ser divulgada. “Eu só fui buscar ajuda após sofrer dois graves acidentes de carro”, conta.

‘SEMPRE ESTAREI EM TRATAMENTO’

A primeira internação para dependentes químicos do professor V.C.S., 42 anos, ocorreu quando ele ainda tinha 36 anos e diante do risco de perder o emprego decidiu pedir ajuda na empresa em que trabalhava. “Apesar de ficar um mês internado na clínica sem colocar uma gota de álcool na boca, a primeira coisa que eu fiz quando saí foi beber e voltar à rotina de antes. Eu fui convidado a sair da empresa”, disse.

Com a perda do emprego e o agravamento da doença, o professor se entregou ainda mais à bebida. A luz no fim do túnel só veio depois de voltar para a casa dos pais, já sem condições financeiras de se manter sozinho. “A minha mãe disse que eu teria que buscar tratamento. Só assim ela me ajudaria. Foi quando eu procurei o AA”, disse o professor, que está há 1 ano e 4 meses em tratamento.

“O alcoolismo é uma doença da qual eu sempre estarei em tratamento. Se eu parar de frequentar as reuniões hoje, pode ser que amanhã eu já esteja na mesma situação em que eu estava há dois anos”, disse.

FAMILIARES DEVEM BUSCAR AJUDA

Para cada alcoólatra, estima-se que outras quatro pessoas (parentes ou amigos) próximas sejam atingidas diretamente. É por isso que os familiares também devem buscar ajuda. O Al-Anon, braço do AA (Alcoólicos Anônimos) destinado a parentes de alcoólatras, também consiste em um tratamento de 12 passos para que a pessoa possa se livrar do trauma e auxiliar o dependente a se livrar do vício em bebida. “Eu fui buscar ajuda antes do meu marido. Só dois anos depois de eu começar a participar das reuniões é que ele se deu conta de que precisava de ajuda”, disse a aposentada C.D., 69 anos.

Ela diz que o principal ponto desenvolvido no trabalho do grupo é a tolerância com os dependentes. “Antes de entrar para o grupo, ele chegava em casa e a gente só brigava. Foi a minha mudança de comportamento que o transformou”, disse a idosa.

Há dez anos o seu marido faz tratamento no AA e ela continua frequentando os grupos de apoio.

POR SER MAIS BARATA, PINGA VIRA OPÇÃO

O diretor do Proad (Programa de Orientação e Atendimento a Dependentes) da Unifesp, Dartiu Xavier da Silveira, explica que uma das principais dificuldades para o combate ao alcoolismo é o fácil acesso à bebida. “É um vício muito tolerado pela sociedade, por isso é difícil que as pessoas reconheçam que estão doentes”, disse.

Além do fácil acesso, o baixo custo da cachaça é um outro ponto que pode incentivar o uso. “Em qualquer esquina a pessoa pode comprar uma dose de cachaça com trocados”, afirma Liamar Ferreira, psiquiatra da equipe de Saúde Mental da Secretaria Municipal da Saúde. Um exemplo dado pelos profissionais é a cachaça conhecida como “barrigudinha” —meio litro custa cerca de R$ 5 e seu teor alcoólico é muito alto.

Pesquisa da Ibope Inteligência, com base em dados da Confederação Nacional da Indústria, mostra que quando a expectativa do consumidor em relação a situação econômica do país cai, aumenta o número de venda de garrafas de cachaça.

O psiquiatra Hewdy Lobo Ribeiro, diretor clínico do hospital Lacan, alerta para outro fenômeno neste momento de crise. “É muito comum as pessoas substituírem bebidas caras por opções mais baratas. Essa mudança faz com que a pessoa passe a ingerir uma quantidade de álcool ainda maior.”

Misturar analgésicos com bebidas alcoólicas: quais os riscos?

CISA – Centro de Informações sobre Saúde e Álcool

O uso de medicamentos para controle de dores, conhecidos como analgésicos, é uma prática comum. Inclusive, um dos medicamentos mais vendidos no Brasil é um analgésico, composto de dipirona, cafeína e orfenafrina. Muitos deles podem ser comprados sem a necessidade de receita médica, enquanto outros mais potentes, especialmente aqueles derivados de opioide, exigem prescrição controlada, tendo em vista seu maior potencial de efeitos colaterais, incluindo quadros de dependência da substância.

Diante disso, o CISA alerta sobre os riscos do consumo de bebidas alcoólicas por pessoas que utilizam estes medicamentos. Em linhas gerais, o álcool pode interagir negativamente com muitos medicamentos, prescritos ou até naturais. Entretanto, como cada medicamento tem um perfil particular de efeitos colaterais e metabolização, é preciso analisar como cada analgésico especificamente interage com bebidas alcoólicas.

A interação de álcool com esta substância é especialmente arriscada para problemas no fígado

Vale lembrar que os efeitos do álcool para as mulheres podem oferecer mais riscos, considerando que, devido a sua composição corporal com menos água que os homens, a concentração de álcool no sangue alcança níveis mais elevados. Da mesma forma, pessoas idosas também ficam sob particular risco para os prejuízos destas interações, ainda mais se fizerem uso de outros medicamentos. Assim, estão mais vulneráveis para potenciais efeitos de sonolência ou danos hepáticos de tais interações.

O intervalo de tempo entre a ingestão do medicamento e a de álcool capaz de induzir a interação é variável, entre poucas horas a dias. Portanto, a recomendação para quando uma pessoa precisa usar um medicamento que sabidamente interage com álcool, é para não consumir bebida alcoólica. Para saber mais sobre os riscos em relação ao medicamento em uso, procure seu médico.

A influência dos amigos no consumo de álcool

CISA – Centro de Informações sobre Saúde e Álcool

No dia 20 de julho tradicionalmente comemora-se o ”Dia do amigo” no Brasil, e no dia 30 do mesmo mês o “Dia Internacional da Amizade”, conforme estabelecido pela Organização das Nações Unidas. Considerando que muitas pessoas que consomem álcool o fazem entre amigos – hábito cultural no Brasil, é importante observarmos como as amizades podem influenciar o consumo de álcool, e vice-versa. Apesar de ser mais reconhecido que um ou alguns amigos podem levar a pessoa a beber mais ou menos, a literatura mais recente tem demonstrado que o consumo de álcool e, principalmente, a capacidade que cada um tem de beber e metabolizar o álcool tendem a direcionar em quais grupos um indivíduo será inserido.

Existe uma característica individual, hereditária, que determina a sensibilidade de cada um aos efeitos do álcool, chamada de “nível de resposta ao álcool”. Algumas pessoas, desde o primeiro contato com álcool, são menos sensíveis aos efeitos dessa substância e precisam de mais doses que outras para alcançarem a mesma sensação de embriaguez. Dessa forma, ao longo da vida, esses indivíduos menos sensíveis ao álcool têm risco elevado de ingerir maiores quantidades e gastar mais tempo consumindo bebidas alcoólicas, e frequentemente se agrupam com outros que também apresentam esta característica. A literatura aponta que pares dos indivíduos com baixa resposta ao álcool (menor sensibilidade e consequente maior uso) também são bebedores pesados, fator que reforça o hábito de beber e aumenta o risco de consequências negativas à saúde.

Ainda existem regras presentes em grupos e sociedades que modulam o comportamento e motivam as pessoas a agir, denominadas “normas sociais”. Em determinados grupos, em especial jovens, há uma ideia equivocada de que é normal e aceitável beber com frequência e intensidade elevadas; apesar de isso não ser comprovado por meio de dados, é a percepção errônea do grupo que acaba por direcionar o comportamento de seus membros. Inclusive, muitos jovens bebem de forma abusiva porque acreditam que este é o comportamento esperado para ele, seguindo uma norma social equivocada e obtendo a sensação de pertencimento ao grupo.

O comportamento individual de consumo de álcool também sofre influência do fenômeno conhecido como pressão de pares. Além da noção mais antiga que “uma pessoa pode levar outra para o mau caminho”, a ciência já demonstrou que os efeitos dos comportamentos dos pares em uma pessoa ocorrem de forma complexa, e não somente da forma mais direta. Quando um grupo está habituado a ter certo comportamento, tenderá a perpetuar este hábito, e será mais difícil resistir quando um indivíduo tentar modificar seu consumo.

Considerando estes conhecimentos de como as amizades podem interferir o consumo de álcool e vice-versa, estratégias de prevenção devem atuar sobre a influência dos pares, por meio da inclusão de treinamento de habilidades para resistir à pressão social, informações corretas sobre o próprio beber em relação aos pares e estratégias específicas para situações festivas. Além disso, é importante corrigir percepções equivocadas de normas sociais, ou seja, confrontar com dados reais a quantidade e frequência de álcool que o indivíduo presume que seus pares consomem e a quantidade de álcool que os indivíduos presumem ser necessário beber para serem aceitos no grupo.

Ao refletir sobre algumas frases populares sobre amizades, como a que diz que amigos são a família que escolhemos, ou que amigos não são feitos, mas sim reconhecidos, é curioso perceber como o consumo de álcool pode estar atrelado também a estas escolhas e a estes reconhecimentos. Sabendo que o álcool é uma substância legalizada, acessível, e que pode acompanhar a vida de uma pessoa por muitos anos, é preciso desenvolver um senso crítico sobre estas questões a fim de prevenir o uso nocivo, e fazer com que as amizades não influenciem negativamente a saúde, mas ao contrário, que sejam uma forma de obter cuidado, companheirismo, e por fim, mais saúde.

A influência do uso do álcool em acidentes graves de trânsito

CISA – Centro de Informações sobre Saúde e Álcool

Cientistas australianos realizaram um estudo em que o uso do álcool foi verificado tanto em motoristas envolvidos em acidentes de trânsito quanto em motoristas abordados aleatoriamente em vias públicas. A finalidade desta comparação foi avaliar a influência do uso do álcool, em seus diversos níveis, no organismo de indivíduos envolvidos em acidentes.

O estudo comparou 571 motoristas envolvidos em acidentes automobilísticos em que pelo menos 1 ocupante morreu ou teve de ir para o hospital, com 588 motoristas abordados aleatoriamente. Os participantes do estudo responderam a um questionário auto – aplicativo e foram avaliados quanto aos níveis de álcool no sangue. Os pesquisadores encontraram que o ato de beber esteve fortemente associado aos acidentes de trânsito e isto ocorreu para diferentes quantidades de álcool ingerido. Trinta por cento dos acidentes de trânsito nesta população foram atribuídas ao uso do álcool sendo que 2/3 destes apresentaram uma concentração alcoólica superior a 150 mg/ 100ml.

A magnitude dos danos provocados pelos acidentes foi semelhante tanto para os indivíduos com alcoolemias (concentração de álcool no sangue) de 3 a 50 mg/ 100ml quanto para níveis de 51 a 150/100 ml. Segundo os autores, a proporção de acidentes de trânsito atribuíveis a motoristas com diferentes concentrações de álcool no sangue, nos mostra que as intervenções devem ser realizadas para diferentes grupos de motoristas. Além do que, medidas preventivas eficazes são imperiosas para se diminuir estas estatísticas.

O consumo de álcool pode causar hipertensão?

CISA – Centro de Informações sobre Saúde e Álcool

O doutor Arthur Guerra, psiquiatra e presidente executivo do Centro de Informações sobre Saúde e Álcool (CISA), responde:

“O consumo moderado ou ocasional de bebidas alcoólicas não deve provocar hipertensão. Entretanto, a ingestão abusiva ou crônica (por muitos anos) em geral pode provocar, sim a doença arterial. Não há, ainda, uma explicação exata sobre qual mecanismo do álcool a provoca, porém ela pode aparecer até mesmo durante uma crise de abstinência na qual o indivíduo também sofre com suadeira, batimentos rápidos do coração, ansiedade, tremedeira e insônia. Ao conseguir voltar a ter uma vida saudável e longe do vício, é possível reverter o quadro hipertenso em algumas horas ou dias.”

Hipertensão e uso excessivo de álcool

CISA – Centro de Informações sobre Saúde e Álcool

A hipertensão arterial sistêmica (HAS) é uma doença crônica e frequente, que se não for prevenida e tratada, pode causar lesões em artérias e orgãos vitais, como coração, cérebro e rins.

Trata-se de uma doença silenciosa, ou seja, que não costuma manifestar sintomas apesar da pressão estar elevada. Por isso a Associação Americana de Cardiologia recomenda que pessoas com mais de 20 anos tenham sua pressão arterial aferida anualmente.

O valor da pressão arterial sofre variações normais ao longo do dia, e assim o diagnóstico de HAS precisa ser feito pelo médico, após aferições feitas em condições adequadas. De acordo com as medidas, a pressão arterial pode ser categorizada conforme quadro abaixo:

Diversos fatores são implicados no risco para hipertensão, como história familiar, idade avançada, sedentarismo, dieta inadequada (principalmente se houver excesso de sal), sobrepeso, obesidade e uso excessivo de álcool. Apesar da relação da HAS com o uso de álcool ter sido notada há 100 anos, somente em 1970 evidências foram capazes de confirmá-la, independente do sexo e de outros potenciais fatores de confusão (como etnia, ingestão de sódio, percentual de gordura ou tabagismo).

Os estudos ainda não são conclusivos quanto às variações da pressão arterial relacionadas ao consumo leve-moderado* de álcool; porém, para os consumidores pesados a prevalência de HAS equivale ao dobro da observada em abstêmios e consumidores leves, sendo possível observar redução da pressão arterial após uma semana de abstinência.

Não há efeito agudo do álcool na pressão arterial dentro de minutos a horas – inclusive pode haver redução, após 8 horas de sono, nas pessoas que bebem à noite. As pesquisas mostram que a pressão arterial tende a se elevar de forma subaguda, dentro de dias a semanas. Além disso, há evidências que o consumo de álcool pode reduzir o efeito de medicamentos para HAS, e que a redução deste consumo pode exercer papel semelhante ou maior na HAS que a perda de peso, atividade física e redução na ingestão de sal. O mecanismo implicado nesta relação ainda não foi esclarecido, mas observa-se que o tipo de bebida, cerveja, vinho ou destilado não interfere consideravelmente, concluindo-se ser devido ao próprio etanol.

A Associação Americana de Cardiologia recomenda que, se a pessoa consome bebidas alcoólicas, o faça com moderação. Isso significa uma média de 1 a 2 doses por dia para homens e 1 por dia para as mulheres. Alerta também que beber acima destes limites aumenta os riscos para o alcoolismo, hipertensão arterial, obesidade, acidente vascular cerebral, câncer de mama e acidentes.

*Consumo pesado e leve-moderado foram definidos neste estudo, respectivamente, como a ingestão de ao menos 3, e menos que 3 doses de álcool por dia. A Organização Mundial de Saúde estabelece que 1 dose padrão contém aproximadamente 10 a 12 g de álcool puro, o equivalente a uma lata de cerveja (330 ml), ou uma taça de vinho (100 ml) ou uma dose de destilado (30 ml).

*Para saber mais sobre padrões de consumo do álcool, acesse: http://www.cisa.org.br/artigo/6988/hipertensao-uso-excessivo-alcool.php.

Consequências do uso moderado de álcool

CISA – Centro de Informações sobre Saúde e Álcool

De acordo com relatório do National Institute on Alcohol Abuse and Alcoholism (NIAAA) publicado em junho de 2004, aproximadamente 35% da população adulta americana não consome nenhum tipo de bebida alcoólica, 60% faz um uso moderado do álcool e 5-7% abusa do álcool ou são alcoolistas. O consumo de álcool nos Estados Unidos causa 100.000 mortes anuais, dentre as quais 16.000 estão associadas a acidentes de trânsito. Verifica-se ainda que indivíduos que abusam do álcool vêem-se envolvidos em um número maior de mortes relacionadas a episódios de violência, suicídio, envenenamento, cirrose hepática, câncer e derrame. Paralelo aos efeitos maléficos do abuso de bebidas alcoólicas, verifica-se que a álcool contribui para a prevenção de doenças coronarianas, as quais são a maior causa de morte nos Estados Unidos.

O relatório do NIAAA aponta que nos últimos 50 anos vários estudos exploraram a relação entre consumo de bebidas alcoólicas e sua relação com diversas questões de saúde, incluindo câncer, doenças cardiovasculares, diabetes e demência. Muitas das pesquisas avaliaram a relação entre o não consumo de álcool, o consumo moderado de bebidas alcoólicas e seu abuso. Este artigo resume os principais resultados de pesquisas relacionadas com o uso moderado de álcool, seus potenciais benefícios e malefícios.

Considerações sobre a definição de uso moderado

Apesar do Departamento Americano de Saúde e Serviços Humanos (U.S. Department of Health and Human Services) definir que o consumo moderado de álcool equivale a uma dose de bebida diária para as mulheres e duas doses diárias para os homens, muitos estudos estabeleceram diferentes critérios para o consumo moderado em suas investigações. Este fato pode dificultar a interpretação dos resultados relacionados aos efeitos benéficos e maléficos do uso moderado de álcool. É também importante compreender que quantidades consideradas moderadas em algumas situações, podem ser consideradas abusivas em outras (grávidas, pessoas que vão dirigir, entre outros casos). O relatório do NIAAA esclarece que as dificuldades relacionadas a definição de uso moderado de álcool é até certo ponto resultado das diferenças individuais,  ou seja, a quantidade de álcool que uma pessoa pode consumir sem estar intoxicada varia de acordo com a experiência, tolerância, metabolismo, vulnerabilidade genética, estilo de vida e tempo em que o álcool é consumido (três doses em uma hora produz uma concentração de álcool no sangue muito maior do que três doses no curso de três horas).

Consequências do consumo moderado de álcool

O NIAAA explora as consequências do consumo moderado de álcool nas seguintes áreas:

1.     Problemas cardiovasculares:

O relatório do NIAAA afirma que pesquisas científicas evidenciam que uma a quatro doses de álcool diárias reduzem significativamente as chances de problemas cardiovasculares, e cinco ou mais doses diárias aumentam significativamente sua ocorrência. Esta relação mostra-se independente de idade, sexo e se a pessoa é ou não fumante. O relatório ainda aponta a existência de estudos recentes que mostram que os efeitos benéficos do consumo moderado de álcool começam a aparecer quando há o consumo de mais de uma dose diária para  as mulheres e uma dose e meia diária para os homens, sendo que fatores protetores estão relacionados mais com a frequência de consumo do que com o volume (pequenas quantidades de álcool consumido diversas vezes na semana reduzem mais os riscos de problemas coronarianos do que a mesma quantidade consumida com menor frequência).

O NIAAA esclarece que o uso abusivo de álcool pode levar a problemas no sistema cardiovascular, mais especificamente no funcionamento do ventrículo esquerdo do coração, o que pode levar a cardiomiopatia alcoólica. O relatório esclarece que a cardiomiopatia apresenta diversas causas,  sendo que o alcoolismo é um dos maiores fatores relacionados a cardiomiopatia dilatada nos Estados Unidos.

2.     Câncer de mama

Ainda é controversa a relação entre os efeitos do álcool e a incidência de câncer de mama. Dados epidemiológicos apontam associação entre o consumo de álcool e um aumento no risco de câncer, mas esta relação não é tão clara quando há o consumo moderado de álcool. Fatores de risco estão associados a pessoas que se submetem ao  tratamento de reposição de estrógeno e/ou que apresentam casos de câncer de mama na família.

3.     Obesidade e diabetes

Ainda não se sabe exatamente os efeitos da relação entre o consumo moderado de álcool e o aumento de peso. O relatório do NIAAA aponta que o uso moderado de álcool reduz a incidência de diabete tipo 2 tanto em mulheres quanto em homens.

4.     Álcool e gravidez

O consumo abusivo de álcool durante a gravidez pode produzir graves problemas psico-comportamentais na criança, má formação congênita e retardo mental. O consumo moderado de álcool não está associado a má formação congênita, mas pode levar a problemas comportamentais e neurocognitivos. Apesar de se saber que o consumo de álcool tem efeitos maléficos para o feto, ainda não se sabe ao certo a dosagem mínima responsável pelos problemas decorrentes do uso de álcool durante a gravidez. No sentido de prevenir possíveis problemas para o feto e para a criança, em 1981 o governo americano passou a recomendar a abstinência do álcool durante a gravidez.

5.     Amamentação

O relatório no NIAAA afirma que apesar de nos Estados Unidos existir a crença popular de que o álcool ajuda na amamentação aumentando a produção de leite, pesquisas  científicas indicam que o álcool pode até diminuir a produção de leite, especialmente algumas horas depois de seu consumo.  O relatório aconselha as mães a limitar o consumo de álcool e a esperar algumas horas até que chegue o horário da amamentação.

6.     Envelhecimento

O uso abusivo e prolongado de álcool está associado a ocorrência de demências nos indivíduos. Os dois tipos mais comuns de demência na população ocidental são o Alzheimer e a demência vascular. O relatório do NIAAA menciona algumas pesquisas em que o consumo moderado de álcool demonstrou diminuir o risco de demência vascular.

O relatório também esclarece que para uma mesma dose de álcool, o nível de álcool no sangue em idosos é maior do que o nível de álcool no sangue de pessoas mais jovens.  Isto se deve possivelmente a mudanças no índice de massa corpórea, na quantidade de água no corpo e no comprometimento das funções hepáticas.

7. Considerações adicionais

7.1 Dependência e abuso de álcool

O relatório do NIAAA alerta que pessoas que não bebem ou que fazem um uso moderado do álcool podem vir a se tornar alcoolistas caso comecem a aumentar o consumo de bebidas alcoólicas. Inúmeros fatores estão relacionados a dependência de álcool, dentre eles destacam-se os fatores genéticos, ambientais e a interação entre ambos. Uma estimativa baixa prevê que 5 a 7% das pessoas que não consomem álcool ou que fazem um uso esporádico do álcool venham a ter problemas decorrentes de seu uso. Dados epidemiológicos apontam que há um risco maior para o desenvolvimento da dependência alcoólica para os indivíduos que encontram-se na faixa etária entre 18 e 25 anos.

7.2 Consequências cerebrovasculares

Problemas cerebrovasculares (ex: derrames) são a terceira causa de morte e a primeira causa de deficiência nos Estados Unidos. O risco de derrames aumenta com a idade, sendo que apenas 25% dos derrames ocorrem em pessoas com menos de 65 anos. O uso abusivo de álcool é responsável por um aumento na pressão sanguínea aumentando o risco de derrames, sendo que o consumo moderado de álcool pode reduzir o risco de derrame isquêmicos e aumentar a ocorrência de derrames hemorrágicos.

7.3 Comprometimento hepático

O abuso de álcool é a primeira causa de morte por doenças no fígado nos Estados Unidos, sendo que 40 a 90% destas mortes são devidas a cirrose hepática. Apesar de ainda não se saber ao certo o nível de dosagem alcoólica responsável por doenças do fígado, estudos sugerem que 14 doses semanais para os homens e 7 doses por semana já podem levar a ocorrência de doenças hepáticas, enquanto outros estudos sugerem doses mais altas. O relatório do NIAAA sugere que a cirrose hepática está geralmente associada ao consumo de 5 doses de álcool/dia por um período de pelo menos 5 anos.

7.4 Câncer coloretal

De acordo com relatório do NIAAA, resultados de pesquisas relacionadas com o consumo de álcool e a incidência de câncer coloretal são inconclusivos. Alguns estudos encontraram uma relação entre o consumo moderado de álcool (1 a 2 doses/dia) e a incidência de câncer coloretal, enquanto outros não encontraram associação alguma e outros ainda concluíram que o consumo moderado de álcool tem efeito protetor na ocorrência de câncer.

* O National Institute on Alcohol Abuse and Alcoholism (Instituto Nacional de Alcoolismo e Abuso de Álcool) pertence ao Instituto Nacional de Saúde do Governo Americano.